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Fábrica de Ilusões Totalitárias

Depois de quatro quadros comunitários de apoio, sempre na perspetiva de reconversão do país na Flórida da Europa, sem cubanos nem jacarés, Portugal foi finalmente eleito pela World Travel Awards “o Melhor Destino Turístico do Mundo” em 2017. Ganhar dinheiro a apanhar sol parece então possível, ou não fosse este o sector, a hotelaria, o que em média pior remunera os trabalhadores em Portugal.

A reboque das rotas “low cost”, os aeroportos mostram-se essenciais na determinação dos fluxos turísticos. A região Centro não tem nenhuma infraestrutura do tipo, ainda que Coimbra sonhe humidamente com ele. Toda uma enorme região com uma quota de mercado turística bem abaixo da sua representatividade territorial. Aldeias Históricas, Aldeias de Xisto, Aldeias de Montanha, Património Mundial do Vale do Côa, Serra da Estrela… parecem dizer muito pouco a quem vem à procura de águas quentes, pastéis de Belém e “selfies” na Torre dos Clérigos.

No final de março o semicoberto do Parque Urbano do Rio Diz começou a ser ocupado, com o nobre desígnio de se tornar o estaleiro da operação de montagem da grande matrioska de tendas que cada vez mais são a imagem de marca dos 9000 m2 da Feira Ibérica de Turismo. O forte ar da Guarda ainda soprou, mas a única forma da FIT sair daquele espaço será seguir a moda e, em nome da comissão de lesados do PURDiz, fazer uma acusação de armazenamento de armas químicas com consequente bombardeamento aliado.

Se já antes tinha dúvidas da pertinência deste tipo de feira, particularmente naquele espaço específico, depois de tentar explicar, sem sucesso, ao miúdo de 8 anos porque é que tínhamos o campo interdito e a alternativa era impraticável sem galochas, fiquei com a certeza de que somos, como um todo, mais crentes em fábricas de ilusões que qualquer seita e facilmente manipuláveis por pop-ups de qualquer Cambrige analytica da web.

Num Portugal fértil em feiras, mostras e feirinhas regionais, nacionais e internacionais, promove-se pela quinta vez uma feira que se auto afirma como uma plataforma transfronteiriça no panorama nacional e ibérico dos eventos ligados ao Turismo com os objetivos de fomento do intercâmbio estratégico e económico transfronteiriço, o estímulo ao relacionamento comercial entre ambos os países e o desenvolvimento das regiões.

Percebe-se como meia dúzia de clichés que se aplicam a qualquer evento, servem de justificação para um investimento de dois milhões de euros ao longo do tempo, bem como a inutilização de grande parte do parque por meses. E sim, grande parte do dinheiro é comunitário, mas 15% dos 400.000€ de investimento deste ano, são 60.000€ que permitiriam alavancar outros projetos que devolvam mais à economia, pois nesse aspeto a feira é realmente turística, fazendo o dinheiro viajar para fora do concelho. O único local onde se imprime o próprio dinheiro na quantidade que se quer é na “Casa de Papel”.

Bem podem alegar que há estudos que sustentam o fantástico contributo desta feira para o crescimento da economia, que enquanto quase ninguém a reconhecer para lá de um raio de 50 km, não tiver um “boom” imobiliário de corrida às casas do centro histórico, mais casas de alojamento local e hotéis do que uma avenida do Monopólio e a Madonna à procura de casa no Bonfim pertinho do Seminário, tudo não passará por ganhos percentuais com bases de números totais absolutos ridículos.

Esta feira é tudo menos Slim Fit para os cofres municipais. Organize-se um “Prós e Contras” com o tema, “FIT, sim ou não”, deixando já para consideração o verdadeiro corolário do “non sense”. O aluguer do sistema de bilhética para a FIT 2017 custou 9.486€+ IVA, os spots publicitários na RTP 10.000€ + IVA. Os visitantes, a dois euros a entrada, não chegaram aos 5.000. Agora, como diria o secretário-geral da ONU, é só fazer as contas.

Por: Pedro Narciso

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