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Eu, cidadão

Soube no outro dia que o Dr. Álvaro Amaro afastou Américo Rodrigues do cargo de Coordenador da Biblioteca Municipal Eduardo Lourenço.

Já antes o tinha demitido do cargo de Director do Teatro Municipal da Guarda, num processo obscuro e revelador do mais primário caciquismo. O resultado: o TMG deixou de ser uma referência nacional, tendo a programação decaído. No entanto, a agenda do TMG ganhou editoriais assinados pelo Dr. Álvaro Amaro, algo nunca antes visto, passando a ser uma espécie de Boletim Municipal, onde o edil se regozija com o trabalho desenvolvido. Todavia, onde uns vêem bons resultados, eu vejo o desfazer e o desmoronar de um projecto de referência, qualidade e exemplo daquilo que pode ser feito numa cidade afastada dos “grandes centros urbanos”, e que padece dessa doença “nesta cidade nunca há nada”.

Agora, o Dr. Álvaro Amaro decidiu afastar Américo Rodrigues do cargo que actualmente desempenhava. Tal mudança é inserida num contexto que visa incentivar «maior empenho dos trabalhadores da autarquia». Estamos na presença de uma mudança de paradigma: “és muito bom naquilo que fazes? Então vais fazer outra coisa!”. E Américo Rodrigues é muito bom naquilo que faz. Tal facto é comprovado com anos de dedicação à cultura, tendo recebido uma Medalha de Mérito Nacional. Onde antes havia uma Biblioteca amorfa, passou a haver uma Biblioteca digna do nome do seu patrono, com uma programação de qualidade e que faz corar de vergonha certas bibliotecas centrais.

Talvez seja isso que assusta o Dr. Álvaro Amaro: uma Biblioteca a fazer títulos de jornais; a fazer sombra a um Teatro Municipal com uma programação básica (aposta directa do actual Presidente da Câmara); uma Biblioteca que não é um armazém de livros, arrumados em armários com grades de arame, inacessíveis — refiro, aqui, a anterior Biblioteca Municipal, situada no Solar Teles de Vasconcelos (o Dr. Álvaro Amaro não se recorda dela, de certeza).

Lamentavelmente, o Dr. Álvaro Amaro pretende para a Biblioteca Municipal um modelo que nos aproxima dos anos 80 do século passado: esta deverá desempenhar um trabalho de arquivo da historiografia da Guarda. Pergunto: o Senhor Presidente da Câmara já ouviu falar do fundo local?

Mas nem tudo está perdido. Caso a recém-nomeada Coordenadora da Biblioteca Municipal cumpra, na íntegra, o plano delineado pelo Dr. Álvaro Amaro, as gerações futuras terão provas documentais de como se destrói toda uma política cultural e toda uma cidade.

* O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

Manuel A. Domingos

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