Explosões, tiros, cheiro a pólvora, gritos, muitos gritos, terá sido assim o cerco de Almeida em 1810 pelas tropas de Napoleão durante as terceiras Invasões Francesas. Mas, passados mais de 200 anos, não há sangue e os mortos ressuscitam em segundos para voltarem para as fileiras e darem o seu melhor na oitava recriação histórica desta batalha, realizada no passado domingo, perante mais de um milhar de espetadores.
A iniciativa culminou o fim-de-semana evocativo do cerco, cujo programa incluiu música, um mercado oitocentista, um seminário internacional sobre edifícios militares e um acampamento histórico com oficinas pedagógicas. No sábado à noite houve ainda a reconstituição do assalto à fortaleza pelas tropas francesas devidamente explicada e comentada pelo coronel Ribeiro de Faria. Tudo foi feito ao pormenor para Almeida consolidar o seu estatuto na Rede Internacional das Batalhas Napoleónicas e os protagonistas esmeraram-se. De resto, ironia do destino, tal como no século XIX, no campo da batalha falou-se inglês, francês, espanhol e português devido aos recriadores envolvidos e aos quais se juntou um grupo vindo da Holanda. O resultado foi um quadro realista daquela que é a única batalha recriada anualmente no nosso país. «Este ano tínhamos imposto um limite de 200 participantes, mas abrimos uma exceção para acolher mais um grupo de espanhóis de Arroyo Molinos, da zona de Cáceres, que também quiseram participar, pelo que tivemos no terreno mais 20 pessoas», refere o diretor do Museu Histórico-Militar de Almeida.
Paulo Amorim, que também vestiu a farda, disse-se satisfeito com o resultado e garante que, atualmente, a vila abaluartada é «inevitavelmente um local de visita obrigatório» para os estudiosos e apreciadores da história militar. Na sua opinião, o que falta agora é «melhorar a animação paralela para atrair e “segurar” mais público nas horas mortas. Penso que este ano já se conseguiu alguma coisa nesse aspeto», acrescentou. O presidente do município concorda ao revelar que, na noite de sábado, dez mil pessoas estiveram em Almeida para assistir à recriação do assalto à fortaleza e ao concerto dos The Curimakers. «Foi uma enchente como não há memória. Se tivéssemos que fazer isto mais vezes durante o ano nem conseguiríamos ter logística para acolher tanta gente, quem ganhou foi a economia local», afirmou Batista Ribeiro, para quem esta «atratividade» de Almeida também é «resultado do património recuperado e da aposta na valorização do importante papel histórico da vila».
De resto, o autarca adiantou que o Museu Histórico-Militar, inaugurado em 2009, recebeu 45 mil visitantes até ao ano passado. «É sinal que estamos no caminho certo», declarou. A próxima aposta da Câmara é a abertura do Museu de Arte Primitiva Africana, com o espólio cedido por Adriano Vasco Rodrigues. Para esse efeito, o município está a negociar com o Estado a cedência, em regime de concessão, do antigo Quartel das Esquadras. «Temos tudo pronto para recuperar o edifício, falta só o aval da tutela para iniciarmos os trabalhos. Penso que esse museu irá complementar a nossa oferta em termos de atratividade», considerou Batista Ribeiro.
Candidatura à UNESCO mantém-se
Este ano, o público que assistiu à recriação do cerco de Almeida foi chamado a dar a sua opinião sobre o evento e a sugerir o que se pode ou deve melhorar. O inquérito é promovido pela Câmara com o apoio da Escola Superior do Porto e da Universidade Coimbra e destina-se «conhecer o nosso público e o seu ponto de vista sobre a atividade», disse Paulo Amorim.
O que já se sabe é que Almeida não vai desistir de candidatar a fortaleza a Património da Humanidade da UNESCO. «Em conjunto ou a sós, nós vamos avançar», confirma Batista Ribeiro. O autarca espera ser recebido brevemente pelo secretário de Estado da Cultura sobre esta matéria. «O trabalho está feito, temos plano estratégico e muita informação científica que sustenta o nosso propósito, pelo que continuamos determinados e apostados em ir para frente com a candidatura», disse. O autarca continua «desagradado» com a postura do município de Elvas, cuja fortaleza foi classificada isoladamente pela UNESCO «quando havia uma candidatura de conjunto com as Câmaras de Almeida, Valença, Marvão e Estremoz», recorda. De resto, a vila do distrito da Guarda vai participar brevemente num congresso sobre fortificações militares em Badajoz (Espanha).
Luis Martins
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