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Pois, Pois

Não sei de onde vêm a pobreza e o atraso do interior. Não sei se a culpa é dos governantes, locais e nacionais. Não sei sequer se se pode falar em culpa. Sei, pelo menos, que o problema não nasceu ontem. Da ancestral miséria agrícola ao descalabro da agricultura, da situação geográfica à vocação migratória, da fatalidade de um país encavalitado no litoral à escassez de investimentos do poder central, as causas são múltiplas, e velhas.

Sei também que, como dizia alguém recentemente, há um enorme “fosso de cinismo” e hipocrisia entre a retórica contra a “interioridade” e a prática dos governantes a distribuir dinheiros e serviços em função do número de pessoas, ou melhor, do número de votantes. Por consequência, para o interior, ficam só os restos.

Os autarcas do interior acabam, fatalmente, por se resignar. E, desgraçadamente, lá vão espatifando as migalhas que o poder central lhes deixa cair, em rotundas, “polidesportivos”, “espaços culturais”, enfim, em “obra feita” e que se veja – mesmo que não sirva para nada –, enquanto reclamam, por dever de ofício e já sem convicção, por mais estradas e por mais investimentos grandiosos e salvíficos, que nunca chegam, ou chegam tarde de mais. Alguns, em momentos de pura alucinação, chegam mesmo a delirar com “magistraturas de influência”, seja lá o que isso for.

A verdade é que já todos percebemos que não podemos contar com Lisboa. Mas, às vezes, gostamos de fingir que sim, ou melhor, queremos acreditar que sim. A ilusão, de resto, dura pouco. De maneira que, paulatinamente, o interior vai perdendo gente e os que ainda cá se vão aguentando são, sobretudo, os que já não têm força ou alternativas melhores.

O caso da Guarda é paradigmático. De nada nos serviu até agora a amizade de Valente com Sócrates. Nem vai servir. Houve quem, ingenuamente, pensasse que sim ou, pelo menos, quisesse acreditar que sim, incluindo provavelmente o próprio Valente.

Agora, foi-nos anunciado que a Câmara da Guarda pode, finalmente (com cinco ou seis anos de atraso), vender lotes na PLIE, porque o Governo lá aprovou o Plano de Pormenor. Vieram cá também uns secretários de Estado quaisquer, numas daquelas “deslocações” que os “estadistas” de vez em quando gostam de fazer à província, perorar sobre”Investimentos e Empreededorismo no distrito da Guarda”. Parece que o Governo vai disponibilizar 4,7 milhões de euros para a PLIE e mais 370 mil euros para obras na antiga biblioteca, que passará a acolher um “centro de incubação de empresas” de “base tecnológica”. Enfim, prometeram mais umas bagatelas, como se com isso deleitassem os indígenas, que, na cabecinha desta gente, são com certeza uns pobrezinhos humildes e meio saloios. Custa-me admiti-lo, mas é nestas ocasiões que sinto uma certa admiração pelo Alberto João Jardim. Ao menos a ele não o fazem de parvo.

Por: José Carlos Alexandre

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