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Em maré de abortos!

Só a inteligência poderá mudar a Lei do Aborto em Portugal. Quando este deixar de ser um problemas só das mulheres e for um problema de todos. Quando deixar de ser uma arma de arremesso político e for um tema social que a população queira resolver, em vez de ir à praia em dia de referendo. Provocações premeditadas como as do “Barco do Aborto” só servem para extremar posições e retardar o processo.

As mulheres são mais do que um corpo. São mais do que apenas carne. Por isso, o aborto é algo mais que um corte nessa carne. E uma clínica, tem que ser bem mais que um “talho” – como já foi chamado – que levanta âncoras se vai embora com a próxima maré. O sofrimento de uma mulher que se vê arrastada para o aborto não acaba quando o barco parte. Pelo contrário, começa… E não é Francisco Louçã que vai ajudar a cicatrizar o seu infindável trauma. Nem é Odete Santos que vai afugentar os fantasmas das suas noites de insónia. Nem são os juniores do PS que vão reconstruir a auto-estima destas mulheres.

O chorrilho de disparates que se ouvem de algumas figuras políticas afecta a nossa sanidade mental. É degradante o aproveitamento que fazem do tema. Mais do que uma nova lei do aborto, o que pretendem é abortar o governo. Morte. Angústia. Tormento. Amargura. Tudo serve de arremesso para mais um comício em frente às câmaras de televisão. E a atitude musculada do governo só veio oferecer os foguetes e ajudar à festa. A atitude talvez tenha sido a mais correcta, mas é preciso enquadrar o que se faz, como se faz e porque se faz.

Em Portugal, exceptuando as justificadas excepções previstas na lei, o aborto não é permitido. Assim, esta iniciativa, como uma crónica do aborto anunciado, é desde logo uma afronta à lei. Contudo, boa ou má, é esta a lei que temos e que devemos respeitar. Há muitas leis com as quais eu também não concordo. Porém, isso não me dá o direito de as violar. Também não tenho o direito de pedir novo referendo sempre que não concorde com o resultado. Da mesma forma que não peço novas eleições quando o meu partido não vence.

E, no fim de contas, quem é esta gente que vem da Holanda chamar bárbaros aos portugueses? Qual é a sua moralidade? Quais sãos as suas credenciais para além de agitadores? Com que objectivos atentam contras nossas leis, que boas ou más, foram escolhas do povo português? Vejamos: o que levou este barco a outros países? Polémicas. Confrontos. Agressões. O que conseguiu? Problemas de segurança. Conflitos diplomáticos. E o que resolveu? Nada. Tirando uma ou outra mulher a quem arrancaram o filho do ventre, tudo ficou igual. Não se alteraram leis, nem se ganharam – pelo contrário – novos adeptos para a causa! E em Portugal? Esclareceram alguma coisa? Melhoraram o debate? Ajudaram a sensibilizar os jovens para o planeamento familiar? Não. Três vezes não. Então que vieram cá fazer? Depois do espectáculo (sobredimensionado pela comunicação social) o que restará?

– Apenas lixo. É o que fica sempre depois dos arraiais, das feiras, dos circos de rua.

Notas:

1. Apesar de tudo, entendo que na próxima legislatura, sem circo e pressões mediáticas, sem agitadores estrangeiros, sem provocadores da lei, é urgente retomar a discussão do tema. Com inteligência. Importa actualizar-se a voz dos cidadãos e travar – se é possível – a hipocrisia política em que vivemos, e o papel aviltante a que certos senhores expõem o país.

2. Enquanto por cá bradam pelo aborto, vejo na televisão as mães russas chorar a morte das suas crianças…. Irónico!

Por: João Morgado

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