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E as Empresas?

Toda a riqueza produzida num país vem de uma de quatro categorias: salários, juros, rendas e lucros. Dessas categorias, as mais importantes são, de longe, os salários e os lucros. Ainda há quem viva de juros de depósitos a prazo, mas são muito poucos, tão baixas são as taxas remuneratórias. As rendas, por sua vez, tendo a sua importância, e cada vez maior, são ainda residuais num país de proprietários. Restam-nos os salários e os lucros, e estes vêm das empresas. É aqui, nas empresas, que é criado o grosso do Produto Interno Bruto. É dos salários que as empresas pagam que sai a receita do IRS e é dos seus lucros que sai a receita do IRC. É das compras feitas pelos assalariados e pelas empresas que sai o principal da receita do IVA. É dos descontos feitos pelas empresas que sai o melhor da receita da Segurança Social. São as empresas que dão emprego, que asseguram em Portugal cerca de quatro milhões de postos de trabalho e que vão produzindo (ou já produziram) riqueza para as reformas dos que deixaram de trabalhar. Queiramos ou não, a montante de toda a nossa economia, no topo, no lugar principal e indispensável, temos as empresas. Sem elas, estaríamos todos reduzidos a uma pobreza soviética.

Há quem diga hoje que a única solução para o País, perante a “ameaça” do FMI, consiste em recusar o pagamento da dívida, nacionalizar o principal da economia nacional e “reforçar salários e pensões”. Isto é: incorporávamos como receita os empréstimos contraídos (e abdicávamos para todo o futuro do financiamento da nossa economia, que com este precedente nunca mais nos emprestariam um cêntimo), tornaríamos improdutivas e deficitárias as empresas que ainda dão lucro e aumentávamos a nossa dependência externa, uma vez que, se a nossa balança comercial apenas cobre (menos de) noventa por cento do que consumimos, qualquer aumento do consumo tende a aumentar esse défice.

Mas o mais extraordinário desta “medida” reside na sua total cegueira em relação às empresas. Estas, queiram ou não, têm suportado o principal da crise. Os trabalhadores têm sempre como suporte o Estado, seja pelo subsídio de desemprego, seja pelo Fundo de Garantia Salarial (ambos financiados pelos salários e pelos lucros gerados nas empresas). As empresas são obrigadas por lei a beber o cálice de fel até à última gota. Não podem despedir mesmo quando deixaram de ter trabalho, ou então têm de pagar pesadas indemnizações, tenham ou não reservas financeiras para o fazer. A “medida” proposta parte do princípio de que as empresas continuam a ter lucro e crédito, ou capacidade para continuar a satisfazer todas as reivindicações.

A má notícia é que não têm essa capacidade e ninguém parece perceber porquê, à esquerda e à direita. Outra má notícia é que todos os dias se vão dando incentivos aos empresários para investirem, e serem roubados, noutro lado.

Por: António Ferreira

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