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«É a vida das próprias aldeias que está em causa»

Maioria dos municípios do distrito da Guarda está contra a intenção do Governo encerrar escolas com menos de 21 alunos

Grande parte das 14 Câmaras do distrito da Guarda está preocupada com a repercussão que poderá vir a ter a intenção do Ministério da Educação em encerrar todos os estabelecimentos do ensino básico com menos de 21 alunos. Para debater este assunto, o secretário de Estado da Educação e a directora regional de Educação do Centro reuniram na passada terça-feira com representantes autárquicos. Ao todo, estarão em causa 54 escolas e até há municípios que poderão ficar apenas com uma escola.

É o caso de Aguiar da Beira, cujo edil assegura que «se isso se pudesse concretizar encerrariam quatro escolas e ficaria só a da sede de concelho. Eu não tenho condições para acolher esses alunos. A escola está superlotada e não estou a prever construir um pólo». Deste modo, a medida «tem de ser pensada» e «só depois de se reunir e de se discutir é que poderemos chegar a conclusões», realça Fernando Andrade, que salienta que «há municípios que terão condições para a implementar e outros não». Também em Manteigas se perspectiva a redução das duas escolas actuais para uma. Em causa está uma sala de apoio que existe actualmente na freguesia do Sameiro e que tem funcionado com cerca de 10 alunos do ensino básico. «A encerrar, vai prejudicar a presença de pessoas no meio rural e, do ponto de vista funcional, não traz melhores condições aos alunos», lamenta Esmeraldo Carvalhinho, autarca eleito pelo PS.

Em Figueira de Castelo Rodrigo, o cenário não é melhor, já que apenas duas das escolas do concelho não constam da listagem de encerramentos previstas pelo ministério. São elas as da sede de concelho e da freguesia de Escalhão. Em contraponto, estão na “lista negra” as escolas de Mata de Lobos, Vermiosa, Algodres, Freixeda do Torrão e Reigada, todas com «boas condições», garante António Edmundo. O autarca assegura que «não há logística adequada para receber convenientemente quase mais 60 crianças na sede de concelho», considerando esta medida «desadequada e não pensada», além de «economicista». «Por decreto, encerram-se as escolas sem saber se há capacidade para receber e transportar as crianças. É a vida das próprias aldeias que está em causa. Vão retirar dinheiro às autarquias no Orçamento de Estado e depois temos mais despesas em transportes e vigilantes para acompanhar os alunos», critica.

Trancoso propõe acordo que «terá que ser aprovado ou reprovado em bloco»

Outro dos mais contestatários é o autarca de Gouveia que já avisou que só fecham escolas no concelho «por cima» do seu «cadáver», sendo que o Ministério propõe o encerramento de 10 escolas do primeiro ciclo. Álvaro Amaro classifica a medida como «injusta, sem ter em conta a realidade territorial», sendo ainda «penalizadora para a capacidade de desenvolvimento social e educativo do concelho». A proposta da tutela aponta para o fecho de 10 escolas, «duas delas com projecções de 20 alunos ou mais no próximo ano lectivo». Em Pinhel, António Ruas garante não concordar com o encerramento «para já, enquanto não houver condições para isso. Sem termos um centro escolar condigno e condições para que as escolas encerrem, não vejo razão nenhuma e nem tenho argumentação para a população se não tiver condições muito melhores do que aquelas que tenho hoje em dia para os alunos», sublinha. Das «8, 9 escolas, incluindo algumas salas de apoio», apenas as escolas de Freixedas e Pinhel têm mais de 21 alunos.

Por seu turno, em Trancoso, a autarquia apresentou uma proposta escrita «de acordo a médio prazo com o Ministério da Educação», tendo em vista o reordenamento da rede escolar no concelho nos próximos dois anos e que pretende colocar «todas as crianças do primeiro ciclo em três centros escolares» a construir em Trancoso, Vila Franca das Naves e Palhais, denominado Ribeirinha. Contudo, Júlio Sarmento já avisou que este acordo «a médio prazo terá que ser aprovado ou reprovado em bloco». Actualmente, o município tem a funcionar sete escolas, duas das quais (Freches e Zabro) têm claramente menos de 21 alunos, enquanto a da Cogula tem 20 e «poderá ou não vir a ser encerrada, dependendo da aceitação desse acordo». No Sabugal, António Robalo saiu da reunião de terça-feira com «esperança de que o anunciado não se possa cumprir no concelho», suspendendo o fecho de 10 das 13 escolas actuais.

O edil assegura que não aceita a medida tal como foi apresentada, relativamente às salas de apoio e à lógica de menos de 21 alunos, salientando que o município é bastante extenso e já tem «custos enormes» com deslocações.

Na Guarda deverão encerrar mais sete escolas

No caso de Almeida, a intenção do Governo é manter apenas as EB’ de Almeida e Vilar Formoso, sugerindo o encerramento das escolas da Amoreira e da Miuzela, mas o presidente da Câmara já fez saber que não abdica, pelo menos, da última. «Defendo que essas escolas devem funcionar e que têm condições para o fazer. Da Miuzela demoram cerca de uma hora a chegar tanto a Almeida, como a Vilar Formoso. Defenderei que essas escolas se mantenham em funcionamento quando têm 10 ou mais alunos, o que é o caso», sustenta Baptista Ribeiro. Em representação da Câmara da Guarda esteve a vereadora Elsa Fernandes, que adiantou que «dentro de um ano vão encerrar sensivelmente sete escolas, mas sem grandes dificuldades para aquilo que será a vida e os hábitos das crianças», que irão frequentar os centros escolares do Vale do Mondego, Sequeira e Gonçalo.

Sem especificar os estabelecimentos a encerrar, disse apenas que se trata de escolas nas zonas do «Vale do Mondego, da Serra e numa ou noutra mais próxima dos concelhos vizinhos de Sabugal, Almeida e Pinhel». Em Celorico da Beira, as escolas potencialmente abrangidas pela medida do Governo são a «quase totalidade», à excepção da Lageosa do Mondego e das escolas da sede de concelho, São Pedro e Santa Luzia. Num município que tem actualmente 12 escolas, todas as outras têm entre 15 e 10 alunos. José Luís Cabral, vice-presidente da autarquia, reconhece que se trata de uma questão «um bocado complicada», sendo que «defendemos a criação de condições para a mudança dos alunos e isso será conseguido com a construção do centro escolar», uma vez que «os alunos terão que ir sempre para um local melhor».

Foz Côa inaugura dois centros escolares no próximo ano lectivo

No concelho vizinho de Fornos de Algodres, das três actualmente em funcionamento, a DREC propõe o encerramento da escola de Algodres. «O que propusemos foi adiar esse fecho por mais um ano enquanto decorrerem as obras de requalificação da EB de Fornos, para onde vão todos os alunos. É que tirar os alunos da sua terra para irem para contentores é piorar as condições da escola», adianta José Miranda. Em Seia, a Câmara garante ter conseguido que as Escolas de Tourais-Paranhos e Loriga não fechem e vão continuar «a congregar alunos dos três primeiros ciclos de ensino». Carlos Filipe Camelo entende que a implementação da medida do Governo «traz, em muitos casos, mais prejuízos do que benefícios, concretamente no que se refere aos transportes nas freguesias mais afastadas do concelho, que distam entre si vários quilómetros», refere o edil. Já em Vila Nova de Foz Côa, o processo é mais pacifico, pois as escolas «já iriam fechar na mesma», uma vez que a Câmara conta abrir no início do próximo ano lectivo dois centros escolares na sede de concelho e em Freixo de Numão. Apesar das tentativas, O INTERIOR não conseguiu obter, em tempo útil, uma posição da autarquia da Mêda sobre esta matéria.

Ricardo Cordeiro

«É a vida das próprias aldeias que está em
        causa»

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