Arquivo

Disputa de mão-de-obra barata pode ser prática comum na região

PJ da Guarda investiga suspeita de sequestro de dois homens numa quinta de Mata de Lobos

Existem «algumas indicações» de que o fenómeno da disputa de mão-de-obra barata entre proprietários de quintas possa ser uma prática em expansão na região da Beira Interior. Esta suspeita da Polícia Judiciária da Guarda foi reforçada pela investigação de um caso de alegado sequestro de dois homens numa propriedade da freguesia de Mata de Lobos, concelho de Figueira de Castelo Rodrigo. Contudo, as duas alegadas vítimas prestaram depoimentos contraditórios, havendo uma delas que já negou ter estado sequestrada.

Na semana passada, um homem de 39 anos terá sido agredido, tendo recebido tratamento hospitalar no Centro de Saúde de Figueira de Castelo Rodrigo, depois de, alegadamente, ter estado sequestrado numa quinta em Mata de Lobos, pertencente a indivíduos de etnia cigana. O agredido terá sido levado à força de uma quinta no concelho de Vila Flor, distrito de Bragança, onde se encontrava a trabalhar na agricultura, para Mata de Lobos, onde terá estado sequestrado. O homem foi encontrado maltratado, devido pretensamente à agressão, pela GNR de Figueira de Castelo Rodrigo após denúncia de um residente local. O indivíduo terá mesmo falado da existência de uma segunda vítima. No entanto, as versões apresentadas pelos dois homens não coincidem. «O que a Polícia Judiciária pode confirmar é que há um inquérito sobre presumíveis sequestros de pessoas, mas é uma situação que ainda não está confirmada. Há algumas contradições, como já é do domínio público, nos depoimentos que foram feitos pelas vítimas», adianta Mário Bento, coordenador da PJ da Guarda. De resto, «há partes para ouvir que ainda não se disponibilizaram para prestar depoimentos, porque ainda não foi possível localizar essas pessoas», refere.

Só depois de ouvir todos os “actores” é que a PJ pode «configurar exactamente ou tipificar uma situação ilícita que possa estar subjacente», adianta. Até lá, resta à Judiciária continuar a investigar, sendo certo que uma das alegadas vítimas já deu uma entrevista a um órgão de comunicação social onde garante que «efectivamente não se considera vítima de sequestro», recorda Mário Bento. Assim sendo, «os polícias têm alguma dificuldade para fazer o seu trabalho», reconhece. Confrontado com a hipótese dessa alegada vítima estar a ser coagida para não dizer tudo o que sabe, o coordenador da PJ da Guarda diz «não poder confirmar, nem desmentir» tal cenário, considerando ser «prematuro» avançar com essa possibilidade. Em relação ao facto dos dois homens terem sido supostamente levados de uma quinta de Vila Flor para outra de Mata de Lobos, onde anteriormente já terão trabalhado, o coordenador da PJ diz tratar-se «provavelmente» de uma disputa de mão-de-obra barata. Mas os contornos dessa «angariação de pessoas» ainda estão por definir, nomeadamente aferir «se as pessoas são ou não pagas ou em que situação é que vão trabalhar para essas quintas». Aliás, haverá algumas indicações de que este é um fenómeno que «poderá estar a crescer na região», admite, relembrando o caso de alegado sequestro e escravidão julgado na Covilhã, sentenciado com uma pena de quatro anos de prisão pela prática de cinco crimes de coacção grave.

«Há algumas indicações de que este instrumento é utilizado, muitas vezes, por proprietários de quintas para usufruir de mão-de-obra barata de pessoas, “contratadas” por salários muito reduzidos», adianta. Segundo Mário Bento, este procedimento dos proprietários prender-se-á com a «disputa entre si desta mão-de-obra barata», normalmente constituída por «pessoas sem família» e que apresentam «algum desequilíbrio».

Ricardo Cordeiro

Sobre o autor

Leave a Reply