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Diário Interior

1 de Setembro

Recomeça o caso da Casa Pia. Os advogados parecem tentar impugnar o juiz. Na imprensa e na televisão, sucedem-se as manobras de contra-informação. Espero estar muito enganado, mas a imagem da Justiça, de todas as figuras públicas envolvidas e dos media não vai ser a mais limpa e cristalina quando isto tudo acabar. Sobrará, pelo menos, material para mais um guião de Felícia Cabrita e Moita Flores para uma série de 130 episódios num canal qualquer.

2 de Setembro

Regresso à Universidade. Os corredores ainda vazios, a biblioteca sem gente, gabinetes timidamente abertos. Em duas semanas, a azáfama estará no início e em dois meses o semestre rolará a todo o vapor. Gosto desta sensação de ver o meu mundo a ganhar vida aos poucos.

3 de Setembro

Vejo o filme espanhol “Segundas ao sol”, sobre um grupo de desempregados de um estaleiro de Alicante. Um filme claramente de esquerda, com pretensões de sensibilizar a consciência social da plateia. Eficaz na narrativa, mas incapaz de escapar ao maniqueísmo típico operário-bom e patrão-mau. Funcionaria melhor como um mero retrato social do que como um panfleto para sossegar intelectuais burgueses esquerdistas, preocupados – teoricamente, sempre – com o sofrimento e a opressão que imaginam apenas pela televisão, pelo cinema e pelas páginas dos jornais.

4 de Setembro

Na edição IV do concurso Big Brother, cinco dias depois do seu início, uma adolescente em fim de carreira e uma bomba de testosterona latejante metem-se debaixo de um edredão e fazem sexo, para gáudio daqueles que ainda resistem às emissões. Não me espanta. A ideia deste concurso não é exactamente ganhar, isto é, ser o último a sair. Cada um está lá para dar nas vistas, para se tornar conhecido. Se para isso der jeito uma cena de sexo em frente das câmaras, assim seja. E porque não? Afinal a indústria pornográfica norte-americana tem um star-system tão forte quanto Hollywood.

6 de Setembro

A selecção nacional de futebol perde por 3-0 com a equipa de Espanha. Não deixa de ser significativo que isso se tenha passado perto do local da batalha de S. Mamede e num campo com o nome de D. Afonso Henriques. Não é por acaso que muitos sociólogos chamam ao futebol uma “emulação da guerra” ou uma “guerra simbólica”.

7 de Setembro

Ana Gomes escreve artigo histérico no Público sobre a “ocupação militar” do Iraque. É curioso como muitos dos que hoje estrebucham por estes últimos cinco meses, nunca disseram uma só palavra para criticar – alguns até abençoaram – a presença do Exército Vermelho durante cinco décadas em metade do continente europeu.

8 de Setembro

Na perturbada Palestina, Ahmad Qorei, primeiro-ministro indigitado por Yasser Arafat, afirma que só aceita o cargo se tiver garantias dos EUA e da UE de ser possível garantir a paz na região. Para começar, talvez não fizesse mal em procurar essas garantias junto dos seus correligionários, nomeadamente os senhores do Hamas que consideram que fazer explodir autocarros cheios de gente inocente não é quebrar o acordo de cessar-fogo.

Por: Nuno Amaral Jerónimo

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