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Debandada Geral

A porta da rua é serventia da casa e quem não está bem que abandone a sua “zona de conforto”. Não se percebe que conforto se possa encontrar no desemprego e não interessa discutir agora os detalhes da ordem de despejo, ou sugestão, subliminar ou descarada, dada pelo governo ou sugerida pelo estado do país, mas a verdade é que os portugueses estão de novo de mala, ou trolley, na mão.

A diferença não está só na qualidade das malas, e já nem as fabricam em cartão, está sobretudo na de quem parte. Nos anos sessenta era gente pobre e maioritariamente sem qualificações que ia embora. Agora são empresários falidos, profissionais liberais em dificuldades, jovens licenciados no desemprego. Muitos deixam atrás de si um rasto de dívidas vencidas, com processos em tribunal e penhoras.

No ano que acabou foram cerca de cem mil a partir. Este ano prometem ser muitos mais e se não houver esperança de melhorias o processo vai continuar. As razões parecem evidentes, mas há algumas que não o são tanto. Há é claro a crise económica e o claro desinvestimento do Estado, mas há também a crise demográfica que foi envelhecendo o país e sugando a sua energia vital. Há o vício do crédito que nos pejou as cidades de casas novas e as casas novas de carros e coisas, e mais coisas, que pareciam indispensáveis e são agora a prova de que talvez tenhamos conduzido mal as nossas vidas.

É claro que é muito duro termos de admitir ter feito asneira numa escala nunca antes vista desde o desperdício do ouro do Brasil, que é sempre muito melhor haver bodes expiatórios do que pecadores arrependidos. É mais cómodo atribuir as culpas a quem foi “irresponsavelmente” emprestando o dinheiro do que a quem irresponsavelmente o gastou, ou a quem nos governou incentivando todo este estado de coisas e nada fez para o alterar, a não ser para pior.

E assim estamos a chegar em massa ao check-in do aeroporto, de trolley na mão, com o indispensável para o primeiro mês em Luanda, ou em Zurique, ou em Londres, e um bilhete de avião na mão, comprado in extremis com o que restava do plafond do cartão de crédito.

Por: António Ferreira

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