Arquivo

De Davos, naturalmente, com amor…

Agora Digo Eu

O final do mês de janeiro fica marcado pelo Fórum de Davos.

Com efeito, a burguesia mundial (políticos e empresários) escolheram, mais uma vez, a pequena cidade de Davos, nos Alpes suíços, para sustentarem algumas verdades do tipo monsieur De La Palisse, como sejam as ameaças ao crescimento económico e as alterações climáticas, afirmando em jeito de conclusão que querem reduzir a pobreza, sem mexer nas estruturas do poder instituído, assumindo a contradição do papel do Estado, antes achavam que deveria ser cada vez menor, agora acham que deve ser importante e interventivo (talvez para injetar milhões para preservar bancos que administram grandes fortunas). A alta finança e a elite governamental e empresarial querem um novo reordenamento onde tudo permaneça mais ou menos como está, continuando a aplicar-se o princípio dos ricos e dos pobres e, após a crise, a indústria e o comércio devem continuar na senda da exploração do homem pelo homem. A burguesia mundial não foi capaz de encontrar uma única conclusão sustentável, a não ser a defesa do seu próprio umbigo, tendo em conta que o relatório da Oxfam (Comité de Oxford de combate à fome) “Governar para as elites: Sequestro democrático e desigualdade económica” refere que «metade mais pobre da população mundial possui a mesma riqueza que as 85 pessoas mais ricas do mundo».

Perante isto é tempo de se apelar à evidência, à mobilização da sociedade civil com vista à organização de outras formas de intervenção na ação política, formulação de novas propostas, opondo-nos ao neoliberalismo e ao domínio do mundo pelas multinacionais, pelos governos e instituições ao serviço dos interesses e do grande capital. É tempo de afirmar que a globalização pode ser um processo solidário que respeite os direitos humanos e acabe de vez com a visão redutora da economia, estimulando a reflexão, articulando espaços de verdadeira parceria entre Estados, resolvendo processos de exclusão e desigualdade social, valorizando as experiências reconhecidamente válidas, apostando numa prática democrática solidária entre etnias e povos, condenando em absoluto todas as formas de humilhação e sujeição de um ser pelo outro, neste mundo cão onde todos os dias assistimos à rutura com princípios e valores, à fome, até à encapotada, ao aumento do número de novos pobres, ao desemprego generalizado, aos processos de insolvência e de falência, de pequenas e médias empresas, aos oportunistas que a crise trouxe, que sem pingo de pudor e de vergonha, aproveitam-se para encher os bolsos e criar um ainda maior clima de insegurança, percebendo, da existência de algumas vozes que nos vão dizendo para parar de falar, de reivindicar.

É por toda esta cadeia de razões que temos obrigatoriamente de afirmar que o modelo capitalista faliu. Que depois da crise nada ficará como dantes, sendo que, conforme conclusão de Davos, é necessário salvar o sistema. (Manda a inteligência que se ouse mudar o sistema).

O capitalismo neoliberal criou a economia de mercado, condenando tudo o que tivesse cunho estatal, acabou com os mecanismos que regulavam todos os processos entre mercado e Estado, esvaziando serviços públicos, agravando desigualdades, sempre na perspetiva do deve e haver, empobrecendo o preceito democrático, contestando tudo e todos que não tivessem do seu lado. Verifica-se hoje que tem de haver uma rutura imediata com estas práticas. Que a direita conservadora não tem respostas para a crise global. Não se pode permitir que os investimentos privilegiem apenas os interesses dos grandes e dos poderosos, obrigando-nos a criar critérios e mecanismos de investimento público, fazendo as ruturas necessárias, propondo novos horizontes, respeitando a pessoa humana, preservando ecossistemas dando um futuro sustentável a toda a humanidade.

Os velhos e manhosos políticos do tacho, de carteira cheia e pança redonda, irão em breve perceber que a crise económico-financeira não é mais que o capitalismo em autêntica decadência, onde os jogos baixos, dúbios e ordinários ficarão ultrapassados, estando também em causa o fundamentalismo religioso, que tanto tem contribuindo para alimentar o status, pois o que o mundo precisa não é do discurso de púlpito, ornamentado de bonitas palavras, mas sim uma nova mentalidade assente em políticas claras e objetivas que determinem no imediato o estancar da crise e criem o novo ordenamento.

Os socialistas do século XIX formularam as primeiras perguntas à injustiça do capitalismo. Falharam na altura as respostas, mas as perguntas em pleno século XXI permanecem.

Percebam, de uma vez por todas, que esta é a hora da mudança. A hora da rutura com as práticas dos cúmplices do pensamento único. A hora de saber dar novas respostas. A hora das novas políticas.

Por: Albino Bárbara

Sobre o autor

Leave a Reply