No entanto, o esquema regional proposto para concretização veio a contemplar sete regiões-plano, duas das quais o Norte Interior e a Beira Interior. Por outro lado, não reprovou o Referendo de 1998, exactamente, divisões territoriais como a Beira Interior?
Seremos nós capazes de exigir, atempadamente, a valorização da individualização do “nosso” espaço, apesar de aceitarmos e darmos como boa a imprescindibilidade de aproximar/identificar a dimensão/geografia regional com a eficiência que se espera da nova autarquia?
Por outro lado, encontram-se definidos elementos como poderes, funções, competências, atribuições, repartição de recursos entre os órgãos de nível nacional e os de nível local. O que resta para o regional? De onde lhe advirão meios e competências: do poder central ou do poder municipal? Não se desconhece que algumas das críticas feitas ao poder municipal são as do clientelismo, das relações de poder pessoal, da fraca resistência a oligarquias locais. Recorde-se, ainda, que, num questionário feito a alguns municípios, a posse de uma boa rede de contactos informais foi considerada o terceiro aspecto mais importante a ter em conta na captação de fundos ( Cf ” Em nome da Europa – Portugal em Mudança (1986 – 2006)” – Março 2007 ). Um estudo muito recente dá mesmo conta de as autarquias locais serem consideradas a maior fonte de corrupção em Portugal.
Não seria sensato condicionar a nossa posição ao estabelecimento prévio do necessário equilíbrio sobre as atribuições e os recursos, face à perspectiva do dever de coexistência entre os diversos escalões de poder?
E será extemporâneo colocar a questão de, definidos objectivos, critérios e outros aspectos ( v.g. os modelos de candidatura dos dirigentes) que devem ser colocados a montante e que devem condicionar a nossa opção pelo SIM ou pelo NÃO, saber se o funcionamento das regiões não poderá acarretar o risco de se tornar mais um feudo do poder clientelar dos aparelhos partidários? E nós sabemos que essa clientela está, com muita frequência, mais preocupada com o conquista do poder, pelo poder, e com a adesão/aproximação ao poder do que com a qualidade do poder.
As políticas adoptadas ao longo de décadas, despovoaram o interior, descaracterizaram o litoral, tornaram quase inabitáveis as grandes ( à nossa dimensão) cidades. Que razões temos nós para acreditar que os políticos regionais vão alterar a situação? Em períodos de acentuada escassez de recursos, como provar que os eleitos regionais cumprem melhor a sua função do que os outros? Criam-se impostos regionais? Espera-se que o poder central seja solidário com as regiões, abdicando de projectos como a OTA, o TGV, uma nova Ponte sobre o Tejo?
A identidade colectiva constrói-se com um tempo, não com um decreto. Por isso, não podem as divisões regionais efectuar-se como se elabora um texto. Nem podem ser levadas a cabo sem um debate generalizado e sem audição formal de todos os interessados.
O Velho do Restelo tinha razão. As descobertas, o primeiro passo no sentido da globalização, não trouxeram só coisas boas. Talvez até se tenham traduzido num desastre nacional.
A regionalização não pode ser um acto de fé.
Carlos de Sousa, Licenciado em Direito e pós-graduado em Direito Europeu.