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Cuidado com os Presentes dos Alemães

Os gregos são muito desconfiados. Imaginem que na semana passada a Europa, isto é, a Alemanha, decidiu perdoar uma parte importante da dívida grega e aprovar um novo pacote de ajuda de cem mil milhões de euros e a resposta do governo grego, em lugar de um reconhecido agradecimento, foi declarar ir submeter a oferta a referendo. É verdade que a oferta tinha contrapartidas pesadas, como mais austeridade e controlo externo sobre a política orçamental, mas uma oferta daquelas não se recebe todos os dias. É que, sim, vai ser recusada. O povo grego, sendo-lhe dada finalmente a oportunidade de se pronunciar nas urnas, vai dizer o mesmo que tem dito nas ruas, na forma de um gigantesco “não”, às políticas de austeridade e ao controlo estrangeiro sobre as finanças nacionais.

Por alguma razão são geralmente proibidos referendos sobre impostos. Fosse-nos dada oportunidade, baixaríamos, ou eliminaríamos, o IVA, o IMI, o IRS, as portagens e todas as taxas e impostos sobre os quais tivessem a infeliz ideia de nos dar a oportunidade de uma escolha. Ainda por cima, tudo aquilo que a Alemanha, ou a Europa, têm andado a obrigar a Grécia a fazer tem falhado em toda a linha. A austeridade não tem servido para nada senão para destruir a economia e acabar com as últimas ilusões de esperança, mesmo para um futuro longínquo.

O referendo que Papandreou propõe aos gregos acaba por isso por não ser sobre este pacote de ajuda em particular mas sim sobre as políticas que têm sido seguidas até aqui. Repito: não é difícil adivinhar o resultado do referendo. Haverá é que pensar nas consequências do não dos gregos. Não são muito difíceis de adivinhar e passarão, de imediato, pela saída da Grécia do euro e pela bancarrota. Nada que não se tenha vindo a anunciar nos últimos meses. A única novidade é começar a ser claro que é este o caminho que a Grécia prefere, à falta de melhores presentes dos alemães (como por exemplo uma política monetária mais preocupada com o crescimento da economia do que com a inflação).

Vamos seguir com muita atenção a campanha eleitoral na Grécia e os argumentos que aí se vão esgrimir. Muitos deles irão aplicar-se também aqui, com a vantagem para nós que iremos ter algum tempo de avanço para ver no presente deles o nosso futuro. E é melhor desconfiarmos também dos presentes alemães.

Por: António Ferreira

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