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Contra Lisboa: Marchar, marchar…

Editorial

Esta semana entra em vigor mais um atentado contra o interior: o portajamento das A23 e A25. Trata-se de uma medida altamente penalizadora para todos os que vivemos num território ostracizado e esquecido, a quem foram feitas muitas promessas, quase todas adiadas ou esquecidas. É verdade que nos foram dadas algumas migalhas, essenciais para a sobrevivência deste vasto território, como os estabelecimentos de ensino superior (e de forma excepcional a faculdade de medicina na Covilhã – por mérito próprio) ou as ligações rodoviárias por autoestrada, que agora vamos ter de pagar, mas que, em última análise, é muito pouco para promover o desenvolvimento e combater a desertificação.

Como tantas vezes aqui comentei, a falta de mobilização e contestação ao portajamento das autoestradas do interior é algo surpreendente. Será que as pessoas não perceberam a dimensão das consequências de mais este custo, a somar aos muitos custos da interioridade que já suportamos? Pior, a falta de defesa do interesse da população e da economia regional por parte dos deputados eleitos pela região foi escandalosa. Para que serve eleger deputados, se depois, quando se discutem assuntos relevantes para a região, eles se calam ou se escondem nos confins do parlamento?

Como destaquei, quando fui recebido na Assembleia da República, «pagamos autoestrada até Alverca, mas a partir daí e até Lisboa viajamos gratuitamente. Porquê? Se seguirmos para sul, atravessamos Lisboa em autoestrada pelo novo Eixo Norte-Sul, gratuitamente, e passamos a Ponte 25 de Abril, gratuitamente. Porquê? Saímos em Almada, gratuitamente. Porquê? Ou continuamos até ao Fogueteiro, gratuitamente. Porquê? Porque motivo terei de pagar os 10 quilómetro de autoestrada da Guarda à Benespera, enquanto os 10 quilómetros de autoestrada entre Fogueteiro e Almada são gratuitos? E porque motivo a autoestrada de Lisboa a Carcavelos é gratuita? …»

E porque motivo a A23 é a autoestrada mais cara do país? Como se compreende que nos apliquem, por uma má autoestrada, uma taxa/quilómetro superior às vias do litoral? Têm mais carros? Pois… Como se tudo isto fosse pouco, quem vive em Lisboa não precisa de comprar dispositivo pois pode pagar ao portageiro, quem vive no interior ainda terá o custo acrescido de comprar o dispositivo…

Compreende-se que não poderia continuar a gratuitidade das SCUTS, mas as autoestradas para o interior do país deviam ser taxadas com um valor mais alto que as do litoral. Jamais. É inacreditável. A região devia ter reclamado, em tempo útil, por uma autoestrada com preço “social” (mais barata), como os transportes públicos de Lisboa, que dão milhões e milhões de prejuízos, suportado pelo país. Foi isso que solicitei quando fui ouvido pela Comissão parlamentar, infelizmente, fiquei sozinho nessa defesa. Os demais contestatários, os sindicatos, erradamente, exigiam que continuasse a ser gratuita, pediram tudo… – e quem tudo quer, tudo perde – não recebemos nada. Talvez se a mobilização fosse por uma portagem “social”, mais justa para com as regiões mais desfavorecidas, tivesse havido alguma forma de sucesso e não teríamos de pagar um valor tão elevado. Agora, é tarde e não haverá inversão de marcha, viajar vai sair mais caro a todos.

Luis Baptista-Martins

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