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Comunicação e Informação: dos Media à Rede

Razão e Região

As comunidades e as sociedades humanas sempre se dotaram de formas organizativas capazes de dar resposta às suas necessidades vitais, aos ritos identitários que garantiam a sua coesão e a formas estético-expressivas que davam sentido à própria vida em comunidade.

1. A democracia é uma das formas mais avançadas de organização humana, porque, dotando a sociedade de uma forma organizativa eficaz, ela procura, ao mesmo tempo, representar globalmente, embora «em miniatura», a complexidade social e dar expressão máxima a cada indivíduo que a compõe. Daqui a sua força. Mas daqui também a sua exigência. Ou seja, garantindo, pela representação política, a coesão social, ela, ao mesmo tempo, faz irromper a força da individualidade de um modo que era impensável nas sociedades de dominante comunitária. Nesta sua característica reside a diferença relativamente às formas de democracia orgânica ou directa. Mais simplesmente: a ideia de que a delegação de soberania no representante gera um mandato de natureza universal confere ao acto individual de votar uma importância transcendente. E é por isso que a democracia é tão exigente, implicando uma verdadeira capacidade de autodeterminação individual: responsabilidade, partilha e racionalidade.

2. Ora, a envolvente deste acto é cada vez mais de natureza comunicacional e cada vez menos de natureza orgânica, visto que se vive cada vez mais em ambiente de comunicação intensiva e multidireccional. Os suportes desta comunicação, mais do que as comunidades interpessoais, são os media (imprensa escrita, rádio, televisão), mas cada vez mais a Rede, com todas as formas que tem vindo a desenvolver, em particular, o correio electrónico, os blogues, os «sites», as redes sociais. Aliás, o próprio complexo mediático acabou por ter de migrar, com armas e bagagens, para a Rede. E ela cresce a um ritmo cada vez mais intenso. Segundo dados da www.internetworldstats.com, Portugal já conta (em 2010) com 5.168.800 usuários, que correspondem a 41,8% da população, registando-se no «Facebook» 2.688.820, que correspondem a uma penetração de 25%. São números que nos devem pôr a pensar sobretudo quando comparados com os números disponíveis no universo mediático. Por exemplo, nos jornais de referência: o «Público» e o «Diário de Notícias» registaram, este ano, vendas inferiores a 35 mil exemplares, ou seja, juntos, menos de um terço dos espectadores de um telejornal da RTP2 (cuja média, entre 2002 e 2006, foi de 216.000). Num universo mais amplo (dados de 2001), Portugal apresentava 82,7 jornais por cada 1000 habitantes, o que representa um número extremamente baixo quando comparado com países como a Noruega (719,7), o Reino Unido (408,5), os Estados Unidos (263,6), a França (190) ou a Espanha (186). E que equivale a cerca de 850 mil exemplares, número muito inferior ao de um simples telejornal da RTP1, que teve, em média, entre 2002 e 2006, 1.050.000 espectadores. De resto, na relação televisão/jornais diários, Portugal apresentava, em 2001 (dados da Comissão Europeia), numa lista de 14 importantes países europeus, o segundo mais alto diferencial (3,2), logo a seguir à Grécia (5,0), ou seja, por cada 64 telespectadores só vinte é que liam jornais diários. Ora o que é interessante notar é que, constatando-se, em geral, em relação a estes países, uma correspondência genérica na hierarquização dos níveis de penetração dos media e da Rede, comparativamente, os índices de penetração da Rede são, em Portugal, muito superiores aos dos media. Vejamos: enquanto Portugal representa, proporcionalmente, em leitores de jornais, somente 11,5% dos leitores noruegueses, já em relação à Rede a penetração corresponde a 50,7% (da penetração norueguesa). Algo equivalente se passa em relação aos USA: 31,37% de leitores portugueses de jornais, mas já 62,2% da penetração da Rede americana. Aqui mais perto, em relação a Espanha, a 44,4% de leitores de jornais corresponde 76,8% da penetração da Rede espanhola. Em relação ao Facebook, Portugal supera a Espanha (23,7%) e a Alemanha (13,2%).

3. O que é que pretendo significar com estes números? Simplesmente que a) temos um nível de informação via imprensa escrita demasiado baixo; b) que a nossa informação é excessivamente dependente da televisão; c) mas que a comunicação via Rede tem vindo a crescer exponencialmente, exibindo um diferencial em relação aos outros países muito inferior ao dos media. Ou seja, o nível de penetração da Rede, as suas características e o modelo de comunicação envolvido permitem-nos pensar que, em linha de princípio, estamos perante um novo modelo de comunicação que nos poderá ajudar a superar o limitado (em quantidade e em qualidade) panorama mediático-informativo que temos no nosso País, melhorando a qualidade da nossa democracia.

Por: João de Almeida Santos

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