Quando em novembro passado o ministro do Planeamento, Pedro Marques, presidiu na Guarda à cerimónia de adjudicação das obras de requalificação da ligação ferroviária entre a “cidade mais alta” e a Covilhã foi formalizada a reversão de uma das piores decisões do governo anterior: o fim da ligação ferroviária entre as duas cidades e o desprezo pela Linha da Beira Baixa.
Depois de anos de abandono, a desistência da ligação da Guarda à Covilhã era um erro – e, consequentemente, a ligação de Vilar Formoso a Lisboa pela Linha da Beira Baixa, uma alternativa ferroviária à Linha da Beira Alta, estruturante para o país e relevante para toda a Beira Interior. Por isso, o governo fez bem ao incluir a revitalização desta linha no Plano de Investimentos e Infraestruturas Ferrovia 2000. Porém, o cronograma do Ferrovia 2020 apontava a reabertura da Linha para final de 2018; já com atraso, na adjudicação feita em novembro foi anunciada a reabertura da ligação Guarda-Covilhã para março de 2019. No entanto, as obras ainda não começaram e, segundo o “Público” de terça-feira, a obra ainda nem sequer foi consignada por falta de visto do Tribunal de Contas.
Quando em 1988 o Governo de Cavaco Sila apresentou o seu plano para o setor ferroviário, de modernização dos principais eixos e o enceramento de linhas, houve muita expetativa sobre a renovação do transporte ferroviário, mas, na verdade, poucas linhas foram modernizadas e muitas foram desativadas. A falta de aposta e de investimento na rede ferroviária foi mantida (a Linha do Norte está em obras há 19 anos) e, apesar dos muitos planos elaborados por diferentes governos, nenhum plano ferroviário foi cumprido desde o Estado Novo. Ou seja, nos últimos 50 anos, enquanto na Europa o transporte ferroviário sofreu uma verdadeira revolução, em Portugal fecharam-se linhas e o comboio passou a sem um meio de transporte obsoleto.
Outra obra prevista no Plano de Investimentos e Infraestruturas Ferrovia 2000 é o projeto de construção do Corredor Internacional Norte, de Aveiro a Mangualde (entroncando na Linha da Beira Alta e seguindo por linha a modernizar para a Guarda e Salamanca), que a Europa não quer financiar por não ser rentável (orçamentada em 691 milhões de euros), mas que poderia ser uma porta de alta velocidade entre Portugal e a Europa.
Como atrás referi, na Europa, nos últimos 50 anos, o comboio recuperou o seu lugar e é uma opção fundamental no transporte de pessoas e mercadorias. Aqui ao lado, em Espanha, está a ser construída uma “imensa” rede de Alta Velocidade Espanhola (AVE) que vai ligar as principais cidades da península por comboios modernos e rápidos. Hoje, em Espanha já se viaja no conforto e na rapidez da AVE entre as maiores cidades espanholas, e em breve estarão interligadas todas as “capitais” de província.
Entre nós, infelizmente, o TGV jaz morto e enterrado entre os projetos megalómanos de José Sócrates, a indecisão política, os esquemas e a corrupção dos abutres que pululam entre os partidos e os negócios à volta do poder. Portugal vai ficar à margem da alta velocidade, vai ficar pelo comboio de baixa velocidade, das linhas velhas e das carruagens ruidosas e desconfortáveis.
De Bragança a Lisboa já não são nove horas de distância, como cantavam os Xutos, porque a capital trasmontana tem ligação aérea para a capital. Mas para ir da Guarda a Lisboa continuam a ser cinco horas de viagem, como há 50 anos, num comboio que chega sempre atrasado.
Luis Baptista-Martins