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Cavaco e o BPN

O Banco Português de Negócios (BPN) é culpado de boa parte das nossas actuais dificuldades. O Estado foi obrigado a intervir para impedir a sua falência, com o argumento de que assim se evitava uma crise “sistémica” da banca portuguesa, numa operação que nos custou a todos milhares de milhões de euros – e ainda não acabou. Há antigos administradores do BPN que respondem agora em tribunal pelo que fizeram ao banco, sendo alguns deles antigos ministros de Cavaco Silva e um deles, Dias Loureiro, manteve-se como Conselheiro de Estado, nomeado por Cavaco, até ao limite do admissível.

Acontece que se o BPN fez perder dinheiro a muita gente, como todos os contribuintes deste país, e a muitos dos seus pequenos investidores, que chegaram ao ponto de se acorrentarem em frente a agências do banco, nem todos tiveram a sua infeliz sorte. Cavaco, pelo contrário, lucrou €147.000,00 num negócio com acções da Sociedade Lusa de Negócios (SLN), proprietária do BPN, em apenas dois anos e quando o grupo estava já a ser investigado pelo Banco de Portugal.

A resposta oficial, se merece ser considerada resposta é que Cavaco nunca teve interesses no BPN (pois não, mas teve na proprietária – SLN) e que a compra e venda de acções foi um puro e simples negócio entre privados com o qual ninguém tem nada a ver.

Esta última parte não é bem assim, pelo menos se considerarmos o esforço público a que a gestão do grupo obrigou. Por outro lado, temos o direito de saber qual o património do nosso presidente da república e como esse património foi obtido. Para além disso, há que não esquecer que a SLN não estava cotada na bolsa e que quem comprou as acções a Cavaco foi uma empresa do grupo – a SLN Valor.

Há muitas perguntas que deveriam ser feitas e não o foram ainda, que eu saiba, e da resposta a elas depende uma de duas coisas: ou que se cale de vez quem acusa Cavaco de má conduta no caso, ou que Cavaco, por essa má conduta, a verificar-se, desista da sua campanha presidencial.

Gostaria assim de saber o seguinte: quem fixou o preço por acção das participações sociais adquiridas por Cavaco Silva e qual o fundamento económico para esse preço? Que dividendos pagaram as acções nos anos anteriores ao negócio de Cavaco, enquanto essas acções estiveram na sua posse e após a sua revenda à SLN Valor? Quem fixou o preço pelo qual as acções foram adquiridas a Cavaco Silva pela SLN Valor? A SLN Valor comprou acções por essa ocasião a outros investidores? E por que preço? O valor de €2,40 por acção pago a Cavaco Silva tinha alguma justificação nos resultados económicos da empresa e face aos dividendos distribuídos ou prometidos? O que justificou (variante da pergunta anterior) economicamente a valorização das acções de Cavaco Silva em mais de 140% em apenas dois anos? Em suma, é qualquer um dos dois negócios de Cavaco com a SLN um negócio normal ou há indícios de que foi favorecido nesses negócios?

É que, se o negócio foi ruinoso para a SLN, e indirectamente para o BPN, então foi também ruinoso para todos nós, hoje proprietários, por via da sua nacionalização, de um banco falido.

Havia por isso razões para pedir a Cavaco Silva que produzisse publicamente os contratos celebrados com a SLN, assim como há razões para lhe exigir que esclareça detalhadamente todos os pormenores de um negócio de que, tenho a certeza, já estará mais do que arrependido.

Por: António Ferreira

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