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Carta ao presidente da Câmara da Guarda*

O signatário é filho do engenheiro Joaquim Pina Gomes, que foi presidente da Câmara Municipal da Guarda durante 8 anos, ou seja, desde janeiro de 1958 até janeiro de 1966, acumulando esse honroso cargo, para o qual Vossa Excelência foi agora eleito, com o de presidente da Federação de Municípios da Beira Serra.

Antes, havia desempenhado as funções de vereador da mesma Câmara entre 1941 e 1944. Quer como vereador quer como presidente da Câmara, o meu Pai devotou-se inteiramente ao serviço da cidade e de todo o concelho. Nesta última qualidade foi ele que esteve na origem da vinda para a Guarda da fábrica de montagem de automóveis da Renault e da respetiva instalação perto da estação dos caminhos de ferro, em 1963. A esta unidade foi dado o nome de Indústrias Lusitanas Renault.

(…) Como Vossa Excelência sabe, a decisão da Renault de instalar uma fábrica na Guarda deveu-se a uma orientação política da época, que ficou conhecida pela “Lei da Montagem”, que impunha a montagem em Portugal dos veículos destinados ao mercado doméstico e previa ainda restrições na importação de veículos completamente construídos.

Esta política levou à instalação no nosso país de vários construtores. Em 1970, operavam em Portugal 18 fábricas, responsáveis pela montagem de 73.180 unidades. Também a indústria de componentes florescia. Mas a Revolução de 25 de Abril de 1974 alterou o tecido industrial e as fábricas começaram a fechar. A unidade da Guarda manteve-se, mas por pouco tempo.

Em 1989, a Renault vendeu a fábrica aos alemães da Reinshagen, ligados à General Motors (GM). Na altura, os baixos salários praticados em Portugal ainda atraíam grande número de multinacionais. Mas não eram só os custos laborais. Eram também os incentivos financeiros que o Governo dava.

A presença da GM nos componentes para o sector automóvel começou a fazer-se sentir através da Cablesa, que substituiu a Renault na Guarda, com a passagem da montagem automóvel para a produção de cablagens. Depois veio a Delco Remy e, finalmente, a Delphi, até ao respetivo encerramento em 2010.

Senhor Presidente,

O meu Pai faleceu em 2004, mas ainda hoje é recordado por alguns munícipes mais velhos como o presidente da Câmara que trouxe a Renault para a Guarda.

Já depois de ele ter deixado a presidência da autarquia, e como reconhecimento da enorme importância que assumiu para o concelho a instalação na Guarda das Indústrias Lusitanas Renault, o nome do meu Pai foi dado ao largo fronteiro à estação dos caminhos de ferro.

Lamentavelmente, pouco tempo depois de 1974 a Câmara deliberou que tal largo deixasse de ter o nome do meu Pai, que lhe havia sido dado como preito de homenagem ao homem a que o concelho tanto ficou a dever.

Devo ainda fazer notar a Vossa Excelência que na VIII Legislatura da Câmara Corporativa (1961-1965), o meu Pai foi Procurador à mesma, em representação dos municípios rurais dos distritos de Aveiro, Viseu, Coimbra, Guarda, Castelo Branco, Leiria e Lisboa e que, nessa qualidade, se notabilizou por ter desenvolvido uma importante ação em prol dos interesses do concelho da Guarda, tendo sido, além disso, subscritor e relator de inúmeros pareceres daquela Câmara com relevância para a região, caso daquele que incidiu sobre o plano geral de aproveitamento hidráulico da bacia do rio Mondego.

Senhor Presidente,

(…) Esta minha carta destina-se, assim, a solicitar a Vossa Excelência e à Câmara da Guarda a que tão ilustremente passou a presidir, o desenvolvimento das diligências necessárias para que o nome do meu Pai seja reposto no largo da Estação, tal como aconteceu durante vários anos até à deliberação que, incompreensivelmente, levou a que o mesmo de lá fosse retirado.

Jaime Pina Gomes, Lisboa

* Título da responsabilidade da redação

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