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Câmara da Guarda com cerca de 50 milhões de dívidas

Autarquia solicita ao Estado a celebração de um contrato de reequilíbrio financeiro para resolver passivo a curto prazo

A dívida da Câmara da Guarda já é da ordem dos 50 milhões de euros (10 milhões de contos) e não de 42 milhões, como tem vindo a ser assumido desde o Verão. O valor do passivo foi lançado de chofre para cima da mesa na última reunião do executivo, juntamente com um pedido de ajuda ao Governo através da celebração de um contrato de reequilíbrio financeiro. O objectivo é transformar 80 por cento de 30 milhões de euros de dívida a curto prazo em dívida a médio e longo prazo. A deliberação foi aprovada por unanimidade, mas os vereadores do PSD já avisaram a maioria socialista que vão requerer uma auditoria.

Os social-democratas entendem haver «discrepâncias» de valores e querem que as contas do município sejam passadas a pente fino pela Inspecção-Geral da Administração do Território (IGAT) e a Direcção-Geral de Finanças. «Há documentos recentes que espelham uma realidade financeira diferente», estranha Couto Paula, ao desafiar o presidente do município a juntar-se ao PSD no pedido da auditoria. «Seria um bom contributo para a cidade apurar o que se passou nas gestões anteriores. Há que separar o passado do futuro», sustentou, sublinhando que o relatório financeiro apresentado na última quarta-feira confirma aquilo que a oposição vem dizendo há muito tempo. «Sempre dissemos que o orçamento era irrealista, com valores insustentáveis em termos de angariação de receita e, portanto, gerador de défices enormes. E tudo isso se está a reconhecer agora neste documento», disse o vereador, que contabilizou os investimentos previstos e chegou a uma dívida global de 93 milhões de euros. Para o economista, o simples pedido de um contrato de reequilíbrio financeiro implica o «reconhecimento implícito» de que a Câmara está em situação de falência.

José Gomes vai mais longe e acusa os socialistas de terem «enganado o eleitorado ao esconderem a verdade» durante as últimas campanhas, porque esta situação era «previsível». No entanto, apesar das críticas, os social-democratas entendem ser esta a solução «possível e necessária» para ultrapassar a crise financeira e dinamizar a economia local. Quem não parece assustado com a situação é Joaquim Valente, que recusa falar em situação de falência alegando que o contrato de reequilíbrio financeiro é um «acto puro» de gestão. «Vamos propor à tutela transformar 80 por cento da dívida a curto prazo em dívida a médio e longo prazo para termos tesouraria e pagar aos credores, injectando dinheiro na economia local», explica. Uma solução que, segundo o autarca, até permite «ganhar algum» já que o novo empréstimo a contratualizar tem juros mais baixos que os compensatórios devidos aos fornecedores. Mas do que o edil não quer ouvir falar é mesmo de uma auditoria às contas. «Não o permitirei», avisou, dizendo não ser essa a sua preocupação: «Ninguém nos vai fazer perder tempo, pois as contas da Câmara têm sido constantemente avaliadas pelo Tribunal de Contas. Por outro lado, comprometemo-nos a fazer o saneamento financeiro da autarquia e estamos a dar os passos para tal», refere. De resto, garante que as actuais receitas da Câmara dão para «todos os encargos e ainda sobra», mas que é necessária uma «almofada de investimento» para as obras do seu programa eleitoral.

Assembleia Municipal tem que aprovar

Caberá aos ministérios das Finanças e do Ordenamento do Território avalizar este pedido de reequilíbrio financeiro, que é uma autorização especial para a autarquia contrair um novo empréstimo. Contudo, a celebração deste tipo de contrato obedece a um leque de responsabilidades ou condicionalismos a assumir pelo município, conforme regulamentado no Decreto-Lei n.º322/85, de 6 de Agosto. Desde logo, é necessária uma declaração de ruptura financeira ou desequilíbrio financeiro estrutural ratificada pela Assembleia Municipal e a consequente aprovação do plano de reequilíbrio financeiro. No caso da Guarda, tal documento ainda não foi divulgado, mas sabe-se que, a partir de agora, vai haver mais restrições na contracção de maior despesa, nomeadamente a impossibilidade de contratação de pessoal e uma gestão tutelada. A Câmara fica também impedida de realizar novos investimentos que ponham em causa as responsabilidades financeiras que quer passar para longo prazo. Mas exigem-se igualmente novas formas de gerar receitas, o que, na Guarda, já foi posto em prática, por exemplo, com a cobrança do estacionamento na cave dos Paços do Concelho aos funcionários do município.

Luis Martins

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