Arquivo

Brisa

Bilhete Postal

Um fantástico turbilhão solta-se numa praia tranquila. Sai uma tormenta num lugar sem vento e sem ondas. Tudo calmo agora e um rebuliço logo depois. Assim se ergue o sentimento depois da provocação, assim surge o rancor depois do amor, assim se projecta em dilúvio o Sol do verão. Mudam as estações e formam-se descontinuidades repentinas. Um trovão abre as chuvas de Abril. Um raio de Sol em Maio exorta o Verão. A vida é feita destes processos de ondulação e a cabeça também. Um homem, alegre agora, está triste depois de atender uma chamada. Que ouviu? Quem lhe falou? Uma mulher chora no assento do condutor de uma carrinha grande. O estacionamento está deserto. Chora só e tem a cabeça baixa. Passam minutos e um carro mais pára no estacionamento. Abre a porta um homem grande e ela levanta a cabeça. Ele abre a porta traseira para tirar algo, ela sorri, como se nunca chorara. Ele baixa a cabeça e inclina-se dentro do carro. Ela abre a porta e sai com a cara feliz. De trás salta uma criança pequena. Corre, as crianças correm sempre, para ela que ri. Diz um nome que deveria ser Margarida ou Rosa, parece coisa de flor. Longe disto o telefone toca outra vez e um homem triste atende. Encosta-se a uma parede. O pé ergue-se e toca a cal que tomba no chão. Um muro velho caiado. Ele suja a roupa escura no encosto das costas com o muro velho. Os olhos choram. a tristeza navega por entre nós e move-se do carro no parque, do rosto da mulher, como uma brisa para o rosto maduro de um homem de escuro, antes alegre, que agora chora. O telefone desliga-se e ele volta a caminhar marcado de cal nas costas. A brisa continua a soprar aquela tristeza que é perfume voando por entre nós, escolhendo gente como as estações escolhem seu fim. Não há hora e não há dia. Uma brisa trás o verão e outra leva o choro. O Verão está com ela e a chuva vai com ele.

Por: Diogo Cabrita

Sobre o autor

Leave a Reply