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Bom senso

Crónica Política

A vida em sociedade nos nossos dias é naturalmente complexa pela multiplicidade de relações que todos os dias nos acontecem. Uma sociedade aberta ao mundo, exposta ao turbilhão da vida, à mercê da volúpia dos mercados, acorda sempre sobressaltada por amanhãs que nos anunciam horizontes novos, feitos de mudança e de imprevisibilidade. Sobretudo quando vivemos descansados e à sombra de conceções ancoradas em preceitos de Lei, desvalorizados pela vida e fora do seu tempo.

A sociedade política que garante a nossa soberania e regula a nossa vida coletiva exige cada vez mais competência e especialização, que tornem possível a sagacidade de saber antecipar os tempos. Não é, infelizmente, o que nos tem acontecido! Por omissão de todos e culpa de um modelo partidário voltado sobre si próprio, feito de muitas quintas cercadas, onde a discordância é olhada de forma severa. Circunstância que a todos nos devia preocupar para entender melhor as imperfeições de um sistema partidário, essencial à democracia representativa, que necessita de ser aperfeiçoado, mas que só acontecerá quando a consciência coletiva o impuser. Até lá devemos apelar ao bom senso, que desde há muito parece arredado das preocupações de quem faz opinião, de quem legisla e de quem decide.

O bom senso que falta a quem comenta com ligeireza, aos que fazem opinião mal informados, aos que legislam sem medida nem rigor e aos que decidem sem maturidade. O bom senso que faltou a sucessivos governos que sacrificaram o presente e não acautelaram o futuro. O bom senso que falta aos sindicatos que ainda não entenderam que é a sustentabilidade da economia e a saúde das empresas que defendem o trabalho e o trabalhador. O bom senso que soçobra nas Instituições do Estado que fiscalizam a atividade das empresas e das pessoas por pensarem que o erro é privilégio dos contribuintes. O bom senso que não existe na oposição, pela falta de medidas das suas promessas e pela insensatez que condiciona a liberdade de decidir com verdade. O bom senso que falha na apreciação que fazemos dos outros, no comentário apressado que publicamos, na reação menos pensada e a quente. O bom senso que se deveria exigir a quem faz opinião, no rigor da análise, no pleno domínio do conhecimento, na capacidade de procurar entender primeiro, separando a notícia do comentário e informando com verdade.

O bom senso que deveria haver na vida de não misturar o sim e o não ao mesmo tempo, invertendo os sinais, deturpando os factos, fazendo acontecer coisas diferentes. O bom senso, o senso comum, é, na sua essência, uma questão de carácter, de verticalidade, de ética, valores que caíram em desuso, substituídos por novos preconceitos feitos de plasticina e moldáveis a cada circunstância. Desde Maquiavel que os interesses políticos estão dependentes de uma lógica de oportunidades e conveniências e nunca se embaraçaram com a ética.

Assim vão os tempos!

Por: Júlio Sarmento

* Antigo presidente da Distrital da Guarda do PSD e ex-presidente da Câmara de Trancoso

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