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Bolonha, essa bela localidade

Ladrar à Caravana

Enquanto a comunidade académica faz de conta que participa na discussão pública sobre o Processo de Bolonha, e o Ministério faz de conta que recebe e toma em devida conta os contributos de alguns participantes, o que se passa, a meu ver, é que o tal Processo, para todos os intervenientes, só tem um instrumento válido: a máquina de calcular.

Para o Ministério da Ciência, Inovação e Ensino Superior (ganda nome!), é uma forma de deixar de gastar dinheiro, que tem muito mais utilidade em Mercedes e BMWs para os assessores, passando a financiar cursos de apenas 3 anos em vez de 4 ou 5. Para as instituições e sindicatos, a mesma calculadora dá indicações alarmantes: se só pagam 3 anos, lá se vão as entradas no caixa, lá se vão os nossos empreguinhos.

São, obviamente, questões respeitáveis. O Ministério precisa de dinheiro para despesas de representação e contratar assessores; as universidades e politécnicos precisam de dinheiro para pagar as contas da luz, os salários, os computadores, os livros; os professores precisam do dinheiro para pagar a hipoteca da casa, a prestação do carro, a escola dos putos, as férias em Cuba ou S.Tomé.

Falta, parece-me, um elemento fundamental na equação: os estudantes. As instituições contam-nos como cabeças de gado: cada um representa um X nada desprezível na contabilidade, independentemente de estar minimamente vocacionado para o curso onde entrou; o Ministério do Nome Comprido Cumó Caraças considera-os uma despesa sem retorno, logo, algo como a sarna que é preciso a gente descartar-se o mais rápido possível.

Quanto aos estudantes propriamente ditos, tirando uma vaga declaração sobre a necessidade de melhorar a prestação pedagógica dos docentes, só os ouço falar nas propinas e em invadir senados e coisas do género.

As cargas horárias lectivas tendem a reduzir-se como o saldo bancário da maioria dos portugueses. Com justificações estapafúrdias coitadinhos, 20 horas de aulas por semana é uma violência ou cada hora extra de aulas fica a um preço proibitivo e o Ministério não autoriza. Até já se usa Bolonha como argumento: Bolonha prevê menos aulas e mais trabalhos. Pois.

A qualidade do ensino, a qualidade da formação que se pode (deve) exigir das instituições onde se ensina, se estuda, se aprende, pouco ou nada são referenciadas. Coisa pouca, irrelevante para o caso.

Para não se perder mais tempo com isto, não seria melhor a Senhora Ministra decretar já que uma licenciatura fica feita 3 anos depois de entrar na faculdade (nem é preciso assistir às aulas, basta pagar as propinas). Depois, se quiserem aprender alguma coisa de jeito, inscrevem-se num Mestrado.

No estrangeiro.

Por: Jorge Bacelar

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