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Atentado à liberdade religiosa

Atarantados pelas lojas na volúpia dos presentes, esquecemos que o Natal é uma época de religião. Esquecemos que é o filho de Deus a figura central do advento e não um bonacheirão de fato vermelho que alimenta a ilusão no sonhos das crianças de todas as idades. Talvez por isso, porque as questões de fé já não marcam a nossa preocupação do dia-a-dia, esquecemos que em França se trava uma batalha religiosa. O Governo francês determinou a proibição nas instituições públicas do uso de “conspícuos sinais religiosos”. O Presidente Jacques Chirac pronunciou-se a favor da lei que proíbe o uso de símbolos religiosos “ostensivos” nas escolas e apelou mesmo para a sua implementação antes do início do próximo ano lectivo. Contudo, Chirac sublinhou que os alunos poderão continuar a usar “símbolos discretos da sua fé”.

Em meu entender, entramos no século XXI pejados ainda de discriminação religiosa. Nos tempos que correm, repugna-me que um católico emigrante português não possa entrar numa escola francesa com a Cruz ao peito – símbolo máximo do cristianismo. Se consideramos intolerante as comunidades muçulmanas obrigarem as suas mulheres a utilizar o véu, considero igualmente ultrajante proibir essas mulheres de usarem o véu se essa for a sua livre vontade e convicção religiosa.

Numa manifestação na Praça da República, vários manifestantes – sobretudo mulheres – manifestaram o seu desagrado transportando cartazes com mensagens como «Véu, cruz, kippa, deixem-nos decidir», ou «França amada, respeita a minha liberdade».

O que é um símbolo religioso ostensivo? Ostensivo parece ser a imposição governamental que em nome da independência religiosa se torna castradora da “Liberdade” religiosa de cada um. Demonstra pouca “Fraternidade” para os que professam outros cultos e outras crenças. E nega “Solidariedade” para com os povos do mundo que escolheram viver sob a bandeira francesa – sobretudo os cinco milhões de muçulmanos ali residentes, metade dos quais naturalizados, e com os mesmos direitos cívicos e políticos de qualquer francês, incluindo o direito ao voto.

No tempo em que o conflito no Médio Oriente vem acicatar as lutas religiosas, descobrimos no seio da União Europeia uma perigosa intolerância religiosa, que tende a alastrar. E Portugal, cada vez mais receptor de comunidades emigrantes, deverá acautelar futuras situações. É sabido que o choque de culturas levanta problemas. Mas nas sociedade modernas, multiculturais e pluri-religiosas, os problemas merecem soluções inteligentes e não a falta de memória para as lições da história.

João Morgado, Covilhã

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