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As palavras de um dia

JOANA VALENTE (11º. A), 2.º LUGAR DO PRÉMIO RIACHO 08/09

É com um simples «Bom dia!» que começa a responsabilidade que dou às palavras de me tornarem pessoa e a minha confiança nelas é permanente pois as minhas certezas são totalmente absolutas no que diz respeito às suas intenções de me mostrarem como um ser social e à sua capacidade de me unirem, de me prenderem, mas também de me afastarem do próximo.

Onde estou? Para onde vou? Que sou eu? Interrogo-me vezes sem conta, e são pilhas de letras encaixotadas a génese do despertar para a minha existência, a base das perguntas sem resposta, dos porquês sobre os quais me debruço diariamente, e aos quais nenhuma resposta concreta surge no meu jovem cérebro, com um conhecimento ainda diminuto dos tantos significados que fazem parte do Universo, e que nunca irei conhecer na sua integridade. Portanto, considero que, em parte, permanecerei para sempre ignorante e um pouco à margem de toda essa importância que a linguagem detém.

Mas é também esse amontoado de rabiscos estampados na minha mente, ou pintalgados em qualquer lugar para onde eu olhe ou me fixe, que no fundo são o coração de todos os dias de existência e por isso são as pedras que constroem uma vida, um ser humano. E são elas, as palavras que tanto conseguem dar as respostas mais básicas, como construir as perguntas mais complexas e neste sentido forma-se um ciclo vicioso, em que, quando estão soltas e seguras, umas brotam das outras, mas no momento em que a timidez ou a pouca segurança as ataca tropeçam umas nas outras ou simplesmente teimam em não nascer e permanecem inatas, sem qualquer tipo de maturação ou significado.

Desde o despertar, elas bailam na minha mente, pairam nos meus ouvidos e desenham-se no meu falar; e até nos mais ilusórios sonhos elas são lápis de fantasias e desejos irreais, permitindo, assim, que por momentos, divague e vagueie pelos lugares mais perfeitos, nos quais todas as palavras são inocentes, nobres e tão puras, acumulando em si todo o seu valor, sem qualquer tipo de farsa ou distorção que as martiriza diariamente neste nosso Mundo.

Vivem comigo e tornam-me viva, são elas as portadoras de lágrimas e sorrisos, desgostos e alegrias, memórias e saudade, são o cupido de romances distantes, o esteio de amizades longínquas, relações onde não existem imagens, gestos ou olhares que substituem a voz do outro, os termos sussurrados ao ouvido ou marcados numa folha de papel eterna, e assim os bens palpáveis e passageiros tornam-se indispensáveis e perduram as palavras que raramente se apagam da nossa memória. E sem pedirem licença, são elas próprias quem comanda o decorrer dos dias, das relações, dos sentidos, das experiências, dos pensamentos…

E um mero dia de existência é um misto de letras encadeadas, símbolos encaixados que nos ajudam a amar, a sofrer, a sentir, a mostrar quem somos e que, por vezes, tanto confortam quem as ouve como podem ferir tão profundamente. Conjuntamente com o poder de perfurar a alma de quem as profere, tornam-se causa de arrependimento e revolta, assim como podem rasgar um sorriso, que, tão simples, transpira um orgulho enorme ou sentimentos que tão bem sabe expressar.

E são elas, possuidoras de dons inalcançáveis, que rapidamente constroem relações inquebráveis, como da mesma forma as tornam tão frágeis, e com uma simples expressão destroem amores eternos, tornando-os ligações ténues e efémeras.

Mas são as palavras também capazes de edificar o silêncio tão raro, tão valioso, de uma importância imensa na caminhada da existência ou simplesmente na correria pontual de um dia exaustivo, durante o qual assistimos ao verdadeiro assassínio da linguagem e da comunicação, devido, talvez, à ignorância de quem as usa, que, por sua vez, faz delas objectos dos quais se aproveita para satisfazer a sua ambição descontrolada. E assim, quando damos por nos próprios, somos bombardeados por ordinárias expressões sem significado, que conseguem desvalorizar e vulgarizar palavras tão peculiares à existência humana.

E no fim deste turbilhão de palavras, recordando a importância dos, aparentemente, inócuos e frequentes símbolos que constantemente se formam num olhar, num gesto, num beijo e que transmitem o nosso perfil ao próximo, com todas as informações necessárias ao conhecimento interior de cada um de nós, reconheço que cada palavra esboçada num sorriso, delineada numa lágrima ou confundida com uma pontinha de revolta e um simples e único carácter que codifica uma parte do nosso ser, assim termino no aconchego de um silêncio só meu, traçado pelas letras que desenham as palavras de mais um dia carregado de significados, sentimentos, alegrias, tristezas e sofrimento, pronunciando uma «Boa noite!» como saudação àqueles que me transmitiram todo o valor das palavras e me ensinaram a usá-las como uma ferramenta essencial à vida.

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