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As ovelhas chegaram à cidade!

Arruada de rebanhos pelas ruas Guarda despertou a atenção de muita gente

«Um sucesso». Foi desta forma que o presidente da Junta de Freguesia de Fernão Joanes caracterizou a iniciativa de fazer uma arruada com rebanhos e pastores por algumas das principais ruas da cidade da Guarda. Esta iniciativa teve lugar no último sábado no âmbito de mais uma edição da Festa da Transumância – Festival de Cultura Popular de Fernão Joanes.

Poucos minutos passavam das 10 horas quando as mais de 100 ovelhas, divididas em dois grupos, chegaram à Praça Velha, tendo a imponente Sé Catedral como pano de fundo. Antes, já tinham passado pela Avenida Rainha D. Amélia e Ruas Batalha Reis, Alves Roçadas e do Comércio. Muitas foram as pessoas, cerca de 200, que não quiseram perder a oportunidade de ver “in loco” as ovelhas e com quem elas trabalham diariamente. É que, mesmo junto à estátua de D. Sancho, foram também feitas demonstrações de artes e ofícios ligados à pastorícia, como a feitura do queijo, requeijão, tosquias e desenho das ovelhas, enramar e apernar as ovelhas, as choças de palha, as chavelhas ou os chocalhos. Um dos trabalhos mais apreciados foi o de José Camilo, de 75 anos, que tosquiou uma ovelha com uma tesoura, deixando o animal com uns singulares desenhos na sua pele. Orgulhoso de ter mostrado esta “arte” na cidade da Guarda, conta que começou a aprender a tosquiar ovelhas com apenas 14 anos de idade. José Camilo, que antes de começar a tosquiar tirou o chapéu e benzeu-se, confessa que, por vezes, cortou algumas ovelhas quando as tosquiava: «Isto hoje correu bem, mas às vezes era com cada golpe. Eu punha-lhe a cinza dos cigarros e elas ficavam bem», revela. De resto, é com «pena» que constata que «não há» rapazes novos a querer aprender esta “arte”, embora confesse que, hoje em dia, também já tosquia as suas ovelhas à máquina, tendo acedido a recordar os “velhos tempos” para a Festa da Transumância.

Igualmente experiente nestas andanças é Francisco Mendes Vendeiro. Actualmente com 69 anos é pastor desde os 12 e ainda hoje tem um rebanho com 46 ovelhas. Garante que trazer as ovelhas para a Guarda «deu muito trabalho. Temos que as carregar, descarregar e lavar, enquanto que se fosse na nossa terra dávamos a volta ao povo e não havia problemas», diz. Contudo, garante que ficou «muito contente» por ver as suas ovelhas passearem pela cidade da Guarda e deixa uma garantia: «Se para o ano cá tornarem a fazer a festa já cá venho outra vez pô-las», assegura. Tal como José Camilo, lamenta que entre os mais novos não haja quem queira seguir a vida de pastor: «Tenho um neto que já tem 14 anos e não quer saber das ovelhas. Isto é uma vida muito dura. Já viu o que é nós irmos para os campos a nevar e a chover com a água a correr-nos pelas orelhas abaixo?», questiona quem se levanta «todos os dias» às cinco da manhã, «tanto faz ser de Inverno como de Verão», realça.

Também visivelmente encantado com a envolvência que esta iniciativa encontrou na Praça Velha da Guarda ficou Daniel Vendeiro, presidente da Associação Cultural e Recreativa de Fernão Joanes e também da Junta de Freguesia da aldeia. «Penso que esta ideia de trazer as ovelhas para a Guarda foi um sucesso. Não esperava tanta gente porque era a primeira vez, portanto não sabíamos aquilo com que iríamos contar», afirma. Deste modo, esta ideia tem fortes hipóteses de ser repetida no próximo ano, mas talvez com um «maior» número de ovelhas, isto apesar de algumas terem «tresmalhado» e a meio da manhã de sábado ainda não se sabia do seu paradeiro. Já Virgílio Bento, vice-presidente e vereador da Cultura da Câmara da Guarda, ficou «satisfeito» com a adesão que o evento registou, até porque considera que a população da Guarda «está sensível para todas as actividades de promoção cultural», frisa. Neste sentido, a vinda das ovelhas até à Guarda «em princípio será para continuar» nos anos vindouros.

Ricardo Cordeiro

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