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As legislativas portuguesas jogam-se na Grécia

Este domingo realizam-se as eleições parlamentares helénicas. Ainda é cedo para antecipar o vencedor. Mas algo parece certo. O futuro de Portugal e da União Europeia (UE) joga-se na Grécia.

O grande favorito é o partido de esquerda radical Syriza, depois de longos meses em que todas as sondagens lhe atribuem vantagem face ao segundo classificado, o Nova Democracia do atual primeiro-ministro Antonis Samaras. Parecendo provável a vitória do Syriza e tomando-a como certa para efeitos de análise, subjazem duas importantes premissas a verificar no período pós-eleições.

A primeira e mais imediata prende-se com a capacidade de Tsipras para formar governo. A previsível atomização da votação torna a equação ainda mais difícil. Mesmo contando com o prémio de 50 assentos parlamentares atribuídos ao vencedor, será quase impossível ao Syriza formar Executivo sem a negociação de acordos governamentais. Que poderão determinar cedências face à agenda do partido.

Só então o partido de Alexis Tsipras poderá iniciar o embate decisivo. Impor, numa Europa de sentido único, um caminho alternativo à austeridade criativa. A possibilidade real de conquistar o poder levou a uma maior moderação do discurso de Tsipras, que já não assume o desejo de reverter as políticas previstas nos dois memorandos de entendimento negociados entre a troika e Atenas, nem o de saída da NATO. Todavia, o político grego mantém promessas de políticas anti austeridade e objetivos que embatem de frente com a ortodoxia de Berlim.

Apesar de a Alemanha ter demonstrado abertura para negociar uma reestruturação da dívida, prolongando maturidades e negociando taxas de juro mais favoráveis a Atenas, Tsipras aposta tudo na renegociação de uma dívida pública que designa de “impagável”. Intenção que teria de passar por um forçoso perdão de parte da dívida, algo que penalizaria os contribuintes europeus, visto que grande parte da dívida está hoje nas mãos dos Estados-membros do euro e do MEEF. Berlim e Helsínquia já garantiram que esta hipótese não está sequer em cima da mesa.

Ora, se Tsipras for bem sucedido, a Europa poderá ser obrigada a abandonar a irreversibilidade do caminho único. Algo que, juntamente ao cada vez mais ativo papel do BCE, poderá beneficiar países como Portugal. Mas se for a chanceler Angela Merkel a vencer novo braço-de-ferro, é o discurso de alternativa à austeridade que esmorece. Porque depois do definhamento provocado pela fatalidade que representou a governação de François Hollande, uma derrota do programa do Syriza significará a consagração da irreversibilidade do status-quo. E a morte das várias autoproclamadas alternativas. A saída grega do euro e da UE, mesmo descontando os efeitos sistémicos agora minimizados, seria apenas o início do fim do projeto europeu.

Uma incapacidade do Syriza para implementar uma política alternativa significará também, portanto, que o discurso de António Costa e do PS, clamando por uma voz forte na Europa, é “wishful thinking” ficcionado. Chegados a Outubro já saberemos se as eleições servirão de algo ou se serão mero pró-forma.

Por: David Santiago

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