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Argumentos para a dispersão de quartéis de bombeiros

Reli o artigo de João Canavilhas, publicado no último dia 10 de Julho. Há coisas que se compreendem melhor a uma certa luz, e a uma certa distância. No caso do artigo em causa, ainda mal que assim foi.

(…) Repare-se que numa situação de emergência, por exemplo, em Verdelhos, e não havendo bombeiros no Quartel que possam sair de imediato para fazer o socorro, será preciso tocar a sirene, ou mandar vários SMS, esperar que os voluntários cheguem, se equipem, e saiam. Quem conhece a cidade, sabe que a tarefa de chegar ao Quartel, e depois, de sair com um carro até ao local de um eventual acidente, mesmo que este fique perto (quanto mais em Verdelhos, por exemplo), é algo que não poucas vezes demora mais de uma boa meia hora.

Parece-me assim, que a qualidade do serviço que as nossas corporações prestam ao nível da prontidão do socorro é altamente deficitária. Ressalvo aqui o seguinte: a qualidade do serviço de socorro não depende apenas do factor rapidez, e estou plenamente convencido que em todos os outros parâmetros as nossas corporações de bombeiros excedem o esperado, e posso dar fé do empenho no esforço de formação, por exemplo, da Corporação da Covilhã.

(…) A grande maioria dos serviços de socorro em Portugal é feita por voluntários. Como voluntários, não são pagos, e por isso, existe o sentimento de que não se lhes pode exigir mais. Eu discordo deste ponto de vista. A um voluntário tem que se lhe exigir exactamente o mesmo que se exige a um profissional. E por contrapartida, tem que se lhe dar o mesmo tipo de recursos que se dá a um profissional, e juntar a isso tudo ainda todos os benefícios sociais e fiscais que possam ser dados.

(…) Num modelo mais americanizado (ou europeizado, se preferirem, embora o modelo americano seja o que eu conheço melhor), existiriam diversos quartéis de bombeiros dispersos pelos aglomerados populacionais.

Um quartel da corporação da Covilhã, por exemplo, e um quartel no Paul (como de facto existe), e outros no Ferro, em Unhais, em Verdelhos, no Terlamonte, no Teixoso, no Tortosendo, enfim, nos sítios onde houvesse necessidade e/ou vontade de criar uma secção.

Está claro que uma dispersão deste tipo tem várias vantagens. E algumas desvantagens. (…) Uma das vantagens que me parece advirem deste modelo é a de que desta forma estaríamos a envolver as populações na defesa dos seus próprios interesses, e desta maneira, além da função pedagógica que isto encerra, contornamos em parte o problema do voluntariado.

O problema do voluntariado é grave, em especial se observarmos que no caso das corporações de bombeiros, os voluntários encaixam-se muitas vezes no perfil do trabalhador fabril ou comercial, que pode correr o risco de se ausentar ou faltar a algumas horas de trabalho sem que isso prejudique o seu estatuto e a sua carreira. E se atentarmos às tendências sociais, rapidamente concluímos que esse tipo de postos de trabalho está a diminuir. De facto, não se pode ter o discurso da competitividade e da produtividade e ao mesmo tempo sugerir que um dado trabalhador, seja qual for o posto que ocupe, se pode ausentar quando toca a sirene.

Outra das vantagens é a da rapidez da prestação do serviço de socorro.

Com uma estrutura descentralizada, será mais fácil garantir um socorro rápido e eficaz.

A principal desvantagem parece-me ser a do acréscimo do grau de complexidade de uma estrutura plural, dividida por vários quartéis, com equipamentos em diversas localizações, e ainda, a de gerir as diversas sensibilidades, bairrismos e rivalidades que nestes casos sempre aparecem.

Durante o meu mandato na Associação dos BVC, sugeri uma descentralização da estrutura. O assunto, apesar de ter sido debatido, esbarrou numa série de argumentos.

(…) Uma das coisas que me faz ponderar numa situação de mudança de casa é: «Quanto tempo demoro a chegar de aqui até ao hospital?». Ou se se quiser, numa perspectiva mais actual, como estaria este incêndio se houvesse aqui bombeiros desde a primeira hora? É que num minuto se perde uma vida. Mesmo que seja uma “vida por vida”.

Nuno Garcia, ex-secretário da Direcção dos BV da Covilhã

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