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Apesar das crises vamos engordando

sinais do tempo

Define-se como uma acumulação excessiva de tecido adiposo (ou gordura), resultante de um desequilíbrio entre a ingestão energética e a energia consumida diariamente. Problema grave de saúde pública nos países industrializados e em vias de desenvolvimento. Sofreu uma grande escalada nos meados do século XX.

Em 1989, integrei um grupo de trabalho que tinha como objectivo avaliar a incidência de excesso ponderal e obesidade em alunos do ensino básico e secundário, em Coimbra, no meio rural e urbano. Os resultados eram uns modestos 14 por cento comparativamente com os 31 por cento, de um estudo homólogo efectuado em Lisboa, quinze anos depois. No primeiro estudo concluímos ainda que os alunos obesos tinham melhor aproveitamento escolar e tinham menor actividade física. No segundo verificaram que os pais eram igualmente obesos, que apresentavam um elevado índice de erros nos hábitos alimentares e que passavam demasiadas horas frente à televisão ou no computador.

A Comissão Europeia anunciou que Portugal está entre os países europeus com maior número de crianças com excesso de peso, assim como Malta, Espanha e Itália, excedendo os 30 por cento nas crianças com idades entre os 7 e os 11 anos. Recentemente a Associação Internacional para o Estudo da Obesidade alertou que “estão a acontecer alterações gravíssimas na alimentação em Espanha, por exemplo, onde se passou da tradicional dieta mediterrânica a outra rica em açúcares e gorduras”.

Segundo a OMS a ” obesidade pode atingir graus capazes de afectar a saúde… Uma vez instalada, tende a perpetuar-se, constituindo-se como uma verdadeira doença crónica”.

Na realidade a obesidade mata e é responsável pelas doenças do coração, alguns tipos de cancro, pela diabetes mellitus, por complicações durante e após a cirurgia, pelo reumatismo degenerativo, numa proporção duas a três vezes superior ao da população não obesa.

Em 2004, os governantes portugueses empurrados pelas recomendações da Comunidade Europeia acordaram para esta realidade e proclamaram mudanças no combate à obesidade. Afinal, ainda não tinha chegado a gripe das aves e tínhamos outra epidemia. A doença foi reconhecida oficialmente como crónica e passou a ser comparticipada pela ADSE nas cirurgias para a colocação de banda gástrica.

Foi instituído o Dia Nacional de Luta Contra a Obesidade e em Março de 2005 foi aprovado e publicado em Diário da República II série nº 43, o Programa Nacional de combate à Obesidade, que rezava o seguinte “…considerando, por último, que o País se encontra perante um problema de saúde pública, claramente identificado no Plano Nacional de Saúde 2004-2010, que urge combater e cuja magnitude requer medidas planeadas ao nível nacional que atravessem todo o sistema prestador de cuidados de saúde… o qual justifica a criação de uma comissão de coordenação que acompanhe e avalie o seu desenvolvimento.”

Todos sabemos que nada mais fácil para adiar a resolução dos problemas é criar uma comissão.

Esta tem como missão “acompanhar e avaliar, ao nível nacional, o desenvolvimento do Programa Nacional de Combate à Obesidade e o seu impacto na obtenção de ganhos de saúde” e apresentar orientações técnicas que sirvam de suporte à execução das estratégias consignadas no programa. Passou um ano e o que mudou?

Os medicamentos com acção relevante no tratamento da obesidade têm preços proibitivos e não são comparticipados, sendo utilizados em larga escala antes do verão, mais por motivos estéticos e menos por ganhos em saúde. A cirurgia bariátrica (ou banda gástrica), não é paga no âmbito do Serviço Nacional de Saúde, ou seja os poucos hospitais que a realizam ganham imagem e perdem dinheiro. Nos Centros de Saúde continuam ausentes os Nutricionistas, peça chave, se realmente os políticos encarassem o combate ao excesso ponderal como uma prioridade.

O Sr. Ministro da Saúde, vai fazendo tábua rasa destes problemas e questionado em relação à banda gástrica, respondeu dando o salto para a frente, como é seu hábito, que a prioridade agora é introduzir a medicina dentária no âmbito do Serviço Nacional de Saúde. Em resumo, já percebemos: nem uma coisa nem outra. Ou seja, nem os despachos do próprio ministério (aprovado pelo antecessor) são para levar a sério. Porque acções de formação junto das escolas, já eu e muitos outros técnicos o vamos fazendo, sem protocolos pré estabelecidos.

“Desfrutamos de um dos estilos de vida mais luxuosos da Terra: abundância de alimentos, trabalho automatizado, prazer sem esforço. Mas é exactamente este estilo de vida que nos está a matar”, mas tudo piora quando os políticos são gestores dos dinheiros públicos e não gestores da vida humana.

Nota (fora do contexto): Os glaciares da Groenelândia estão a derreter mais rápido do que seria previsível. Continuem a consumir combustíveis fósseis à mesma cadência e quem vive no litoral que se prepare para mudar para o interior montanhoso. Nós já cá estamos.

Por: João Santiago Correia

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