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Antigo comandante da BT da Guarda diz-se alvo de «vingança»

Cruz Ribeiro acusa sargento da própria Brigada de Trânsito e a «comunicação social de referência»

Cruz Ribeiro sustentou segunda-feira que o julgamento de que está a ser alvo resulta de um «acto de vingança e perseguição» de um sargento da própria Brigada de Trânsito, aludindo a Paulo Costa, que integrou o lote de 150 militares da BT transferidos a 15 de Novembro de 2002 para a Brigada Territorial n.º5, em Coimbra. O antigo comandante do Destacamento de Trânsito da Guarda começou a ser julgado no Tribunal local pela alegada prática dos crimes de denegação de justiça, prevaricação e peculato, no âmbito de uma investigação do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) por causa de uma máquina fotográfica, de cerca de 4.000 euros. O capitão da BT é acusado de alegadamente se ter apropriado do aparelho após tê-lo recebido como garantia do posterior pagamento de uma multa, de 35 a 135 euros, aplicada a um cidadão estrangeiro no IP5 em Outubro de 1995, como noticiou “O Interior” em Abril último.

A primeira sessão ficou marcada por algum atraso por a sala de audiências estar ocupada com outros julgamentos e ainda as dificuldades de comunicação videoconferência com Albufeira, onde deveria ser ouvida uma testemunha. Mas sobretudo pelas declarações de Cruz Ribeiro, que acusou o sargento Paulo Costa, actualmente a comandar o posto territorial da Miuzela do Côa (Almeida) e assistente no processo movido pelo Ministério Público, de o ter denunciado «violando todas as regras deontológicas e éticas» que devem reger as relações entre subordinados e superiores. Mais, considera-se vítima de perseguição de «um grupo de pessoas e órgãos de comunicação social de referência», que não especificou, e do sargento a quem atribuiu nota «insuficiente» na avaliação interna da BT para «apreciação técnica e profissional», o que, na sua opinião, terá motivado a actuação de Paulo Costa. O capitão, actualmente a prestar serviço no Grupo Regional de Trânsito de Lisboa, recordou também que o graduado foi sujeito a três processos disciplinares e confirmou parte dos factos em julgamento, argumentando que o automóvel não pertencia ao condutor pelo que «não podia ser apreendido».

Capitão acreditou na palavra do condutor

Cruz Ribeiro disse também que a situação criada era de «difícil resolução», uma vez que o infractor não tinha dinheiro suficiente para pagar a coima e insistia em prosseguir viagem para Biarritz (França) onde alegadamente a sua mulher estava prestes a ter um bebé. O oficial recordou mesmo que o condutor, um fotojornalista brasileiro, estava «alterado» e que a situação era «uma questão de pressão colocada aos agentes», pois o homem estava «num estado lastimável», chorou e aparentava uma «atitude natural de desespero, dizendo que ia suicidar-se». Nesse sentido, referiu ter tentado resolver o caso através da Embaixada do Brasil em Lisboa e do Consulado do Porto, mas sem resultado.

O fotojornalista terá então apresentado uma máquina fotográfica Reflex Canon, modelo T90, equipada com óptica fixa, como garantia, «sob palavra» que voltaria na quarta-feira seguinte para pagar a coima, tendo ficado um auto como prova da infracção sobre a mesa do oficial. Por «acreditar na palavra» do condutor, Cruz Ribeiro «aconselhou-o» a seguir viagem. O problema é que o infractor nunca mais apareceu nem pagou a multa, não tendo sido localizado até hoje.

A multa acabou por ser paga no seu valor mínimo, apesar de esgotado o prazo para pagamento voluntário, na DGV da Guarda em Fevereiro de 1996 e após ofício daqueles serviços, por um cabo-chefe a quem o antigo comandante da BT deu posteriormente o montante em causa. A acusação refere que a máquina fotográfica ainda se encontrava no destacamento em Dezembro de 2001 e que Cruz Ribeiro terá então alegadamente informado o seu substituto no comando da corporação – o sargento-ajudante Celas Pinto – de que «ela era sua, tendo-a levado consigo de imediato, passando a dispor da mesma». Só em Abril de 2003 foi registada «pela primeira vez» no “Mapa da Situação de Aparelhos Especiais do Destacamento de Trânsito da Guarda”, passando «desde então a fazer parte do seu espólio particular». Face a isto, o Ministério Público entende que o capitão infringiu «frontalmente» as normas aplicáveis ao caso e agiu contra as «obrigações» a que estava sujeito enquanto militar graduado da GNR, «bem como do especial dever que tinha em cumprir, e fazer cumprir, as leis e regulamentos em vigor por ocupar uma posição de chefia e ser inclusive considerado uma autoridade de polícia criminal». O MP considera também que o capitão «quis beneficiar o infractor, sabendo que simultaneamente prejudicava o interesse do Estado português em exercer o seu poder punitivo». O julgamento prossegue dia 15 com a inquirição de testemunhas, das quais dez, todos militares da GNR, são de acusação.

Luis Martins

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