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«Ajudava muito se Aristides Sousa Mendes fizesse parte dos programas curriculares»

Cara a Cara – Entrevista

P – Aristides Sousa Mendes encarna a tolerância e o humanismo. Considera que a sociedade actual é tolerante ou intolerante?

R – Eu acho que na sociedade actual há de tudo, há pessoas tolerantes e pessoas intolerantes. No entanto, creio que estamos em perspectivas de ver um agravamento nesse aspecto, pois as pessoas têm cada vez menos tolerância. Numa generalidade de casos, cada vez pensam menos nos que lhes estão próximos, o que é grave.

P – Passados cinquenta anos o que falta fazer para evocar Sousa Mendes a nível nacional?

R – Acredito que podem ser feitas muitas coisas, um exemplo é a iniciativa que decorreu na Escola Básica dos 2º e 3º ciclos da Sequeira, na Guarda, e que permite transmitir a mensagem às crianças. Em termos de reabilitação, teoricamente ela está feita. Aristides Sousa Mendes foi reintegrado, embora postumamente, na carreira diplomática e houve uma indemnização à família que acabou por reverter para a Fundação.

P – Em que consiste a Fundação Aristides Sousa Mendes?

R – Esta Fundação existe há quatro anos e tem como principal preocupação a promoção de actividades diversas de sensibilização. Tem actualmente a decorrer uma campanha de sangue que visa recolher 30 mil dádivas até ao final deste ano, trata-se de um número emblemático pois são tantas vidas quantas as pessoas salvas por Sousa Mendes na II Guerra Mundial. Portanto a Fundação desenvolve diversos programas com escolas e também tem protocolos com entidades, esta é uma forma de fazer justiça e de cumprir o nosso dever de lutar contra o esquecimento, a indiferença e a intolerância.

P – A casa que pertencia ao Cônsul, em Cabanas de Viriato, está condenada ao esquecimento?

R- Há todo um percurso a efectuar e às vezes as coisas não são tão fáceis quanto o nosso desejo. Enquanto familiar e membro da Fundação acredito que “teoricamente” a justiça foi feita para com Sousa Mendes, mas o Estado português podia agora apoiar a reconstrução da Casa do Passal. Nessa antiga habitação, a Fundação Aristides de Sousa Mendes pretende instalar um museu dedicado ao holocausto. No entanto, estou convencido que teremos muito em breve a felicidade de anunciar o lançamento da primeira pedra na reabilitação.

P – Sousa Mendes é uma figura esquecida ou a esquecer na história portuguesa?

R- É fácil acusar o Governo… Mas a verdade é que os mais pequenos não sabem porque ninguém lhes disse, é claro que ajudava se fizesse parte dos programas curriculares. No entanto, acho que hoje já há algumas referências quando se fala do holocausto. Os miúdos só sabem quando lhes é transmitido, mas não creio que seja um assunto para esquecer, muito pelo contrário. Considero que Sousa Mendes vai ser sempre uma referência obrigatória, principalmente, quando se falar de humanismo, direitos humanos ou tolerância, por todo mundo, não só em Portugal.

P – Que recordações guarda do seu avô?

R – Eu não tenho grandes recordações, tinha cinco anos quando faleceu. Ainda vivi com ele, na casa que hoje pertence à Fundação, mas não tenho, francamente, memória do meu avô.

P – Sousa Mendes já é um herói nacional?

R – Penso que sim. Acho que é uma personalidade que já é conhecida ou que há a obrigação de muita gente conhecer. É que a nossa obrigação, como cidadãos, é ler e perceber os assuntos, e se nos aparecer algo que desconhecemos devemos procurar saber mais. Eu como cidadão tenho que estar atento. Mas Aristides Sousa Mendes é um herói recente da nossa história, é meu avô.

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