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Afetos da boca

Bilhete Postal

Nos circos não verás mais animais. Nas quintas vestirás os bichos. Na pecuária só comidinhas quentes e refeições específicas. Galinhas terão um metro quadrado em cada capoeira. Donos de cão só com jardim e se tiverem capacidade de lhes dar canja. Nos hospitais não comerás bolos nem pastéis, batatas fritas nem doces. Natas nunca mais. Leite só em pó que a ordenha faz mugir e mugido é sinal de dor. Também teremos restrições ferozes na caça. Vamos restringir o tabaco, reduzir o álcool, tolerância zero na condução, impedir a importação de bebidas destiladas. Os animais nos supermercados não serão expostos mortos.

Quer comprar carne? Tem de ser animal vivo. Depois de o ter dez dias, alimentá-lo bem e passeá-lo nos jardins pode ir ao matadouro. Com esta medida vamos condicionar os compradores, afeiçoar as pessoas aos bichos. Compra a vaca e leva-a para o apartamento. Com os peixes o procedimento será melhor: leva o peixe vivo, guarda-o no aquário dez dias. É o período de relacionamento. A sensibilização para os afetos da boca. Só se pode matar o peixe depressa, não na agonia da sufocação. Nos hospitais não trabalhará ninguém que dê maus exemplos para a estratégia da vida saudável, da morte sem doença. Fumadores serão despedidos. Depois iremos reduzir o volume de massa gorda. Obesos não são contratados, aqueles com história de tabaco ou de consumo de droga ou álcool serão afastados. Condutores de motas por risco mais elevado terão uma quota baixa. O D. Sancho da Cristal nunca, a nata jamais. Os hospitais são para criar montras de saúde. Vamos colocar cavalos e cães a participar na recuperação de doentes. Vamos ter um aquário em cada mesa-de-cabeceira. Isto não é fanatismo. Isto é a revolução.

Por: Diogo Cabrita

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