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Ad Hominem

O semanário “O Sol”, na sua edição da passada semana, publicava na primeira página a fotografia de Medina Carreira com o título “Apanhado na Rede”. O pretexto era uma investigação do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), que com o nome de código de “Operação Monte Branco” tem vindo a investigar crimes de fraude fiscal e lavagem de dinheiro a que estará ligado um extenso grupo de empresários. Medina Carreira estaria referenciado numa lista de nomes ligado ao caso e por isso teve a polícia em casa. Tanto quanto se sabe não foi encontrado nada de incriminatório e a referência ao advogado e comentador seria um simples código (como o célebre Jacinto Leite Capelo Rêgo da lista de financiadores do CDS) destinado a esconder o nome do verdadeiro implicado.

Quando “O Sol” remeteu para as bancas essa sua edição sabia perfeitamente o que muitos iriam pensar de Medina Carreira e quais seriam as consequências daquela primeira página. A partir daqui, sempre que ele falar sobre a falência do Estado Social, ou, pior, sobre a necessidade de punir os responsáveis pelo estado a que o país chegou, vai haver alguém que dirá “olha quem fala” ou perguntará “e tens autoridade moral para falar?”

Que isto iria acontecer, e depressa, era uma evidência e os blogues vieram a prová-lo. Um post no “Arrastão” reproduzia a primeira página do “Sol” e perguntava “A Queda de um Anjo?”. Sérgio Lavos, é dele que se trata, defendia-se depois na caixa de comentários das acusações de assassinato de carácter: que se tinha limitado a reproduzir a capa do jornal, que não fez juízos de valor, que aquilo cheirava tudo muito a Miguel Relvas. Miguel Relvas. E eis que o assassínio de carácter se torna transmissível por contágio. Não gosto do ministro e detesto a ideia de que alguém como ele tenha chegado onde chegou – certamente para nosso castigo. Mas outra coisa é lançar sobre ele uma suspeita totalmente gratuita, sem a indicação de um único facto que a sustente.

É cada vez mais evidente que não sabemos o que fazer com a liberdade de expressão, afinal um bem para nós de uso ainda muito recente. Outra nossa dificuldade evidente é uma má compreensão da noção de facto verificável, ou de como se analisam criticamente os factos e se tiram conclusões. O que é o mesmo que dizer que a nossa capacidade de julgamento é muito má, tão má que permite termos ministros como Miguel Relvas.

Por: António Ferreira

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