Vi-te na cama da frente.
Surpreso das cores que tens.
Pálido.
Sem fala.
Olhas-me sem luz.
Olá, disse eu. Nada.
Olá repeti várias vezes. Nada.
Serias tu?
Vi-te ali à frente
e lembrei o liceu.
Vi-te ali e percebi que não estava só.
Olá, tentei dizer-te.
Olhavam para mim vestidas de branco
faziam-me festas
sussurravam coisas que não entendi.
Vi-te ali na frente.
Eras tu! mais magro, descorado.
Tenho sede.
Dói-me algo. Talvez o ventre.
Chamo-te e nunca respondes.
Quero levantar a cabeça,
Chega mais gente,
Calma amigo! grita-me uma tipa.
Está no Hospital!
– Eu sei, devo ter dito.
Mas não disse! Estava com um tubo na boca,
soros nos braços,
deitado numa cama quente
com algum frio, com alguma dor.
Olá, chamei-o de novo!
Nada!
Tenha calma! Já vamos tirar o tubo!
Tossi e pude falar.
Onde estou?
Foi operado. Correu tudo bem.
Não se lembra?
Uma chapada pequena.
Acorde, não adormeça.
Abra a boca.
Tenho tanto sono!
Tenho tanta falta de força.
Olá! o som ouviu-se.
Ouvi-me bem.
Ele não me responde?
Perguntei com o dedo virado
à cama da frente.
– Conhece?
– Parece! Não sei.
– É o Jorge? Aquela barba, aquele corpanzil!
Uma jovem de branco corre a cortina.
a do Jorge!
Depois falamos dele.
Tem dores?
Não. Estou bem!
Onde estou?
Teve um acidente e foi operado.
Eu?
Acidente? Que acidente?
Ia de carro e bateu de frente.
E lá vem aquela gente toda
junto de mim. Agarram-me os braços
– não se pode levantar grita alguém.
Abro os olhos e está tudo escuro agora.
Isto é dormir?
Estou apagado.
Acordei de novo com uma moça morena.
A menina quem é?
Sou enfermeira aqui na Unidade.
Que Unidade?
Onde estou?
E o Jorge?
Que Jorge?
Estava ali na frente!
– Não se pode mexer!
No lugar dele está a cortina fechada
e levam-no todo embrulhado.
É o Jorge?
Não lhe vejo a cara!
Vá lá tenha calma. Ela é doce.
Uma festa na mão.
Conhece-o?
Claro. É o Jorge!
Que faz aqui?
Vocês tiveram um acidente.
Porra! Não se mexa.
Não tire os soros se não amarro-o.
Choquei com o Jorge?
Ele vinha na estrada em contramão
e chocaram de frente!
Você foi operado. Acalme-se.
Oh Doutora, assim não pode ser!
O homem não sossega!
Dê-lhe mais 2 mgs.
Apaguei-me de novo. Tudo negro e nada.
Uma voz conhecida chama-me.
Então? estás bem?
É um filho. Oh pai pregaste-nos
um valente susto.
Que foi?
Um homem em contramão.
Tiveram de te operar à barriga.
Não me dói. E o Jorge?
Quem é o Jorge?
O que estava ali na frente.
A menina bonita vestida de branco
olhou para mim. Aquele Sr. que estava
na cama à sua frente
chama-se mesmo Jorge.
Soubemos à pouco.
E então? que faz ali?
Chocaram.
não se levante!
Pai está sossegado.
– O Jorge morreu!
Por: Diogo Cabrita