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Abílio Curto perde no Constitucional

Ex-autarca poderá ter que cumprir pena de cinco anos e meio prisão por corrupção depois de esgotadas todas as fases de contestação

O futuro de Abílio Curto está pendente de um pedido de aclaração, interposto recentemente no Tribunal Constitucional (TC) por Castanheira Neves, naquela que é a última tentativa para evitar a prisão efectiva do ex-autarca da Guarda durante cinco anos e meio pelo crime de corrupção passiva para acto ilícito. O TC não considerou procedente o recurso interposto pela defesa do antigo presidente que solicitava a anulação do julgamento efectuado na Guarda em Maio de 1998 e que determinou a condenação de Curto por ter exigido a José Gralha e Francisco Fernandes, sócios de uma empresa imobiliária, a quantia de quatro mil contos para emitir uma licença de utilização de um edifício construído na urbanização dos Castelos Velhos, na Guarda. Inicialmente, os construtores não aceitaram a exigência, mas o então presidente reduziu o montante primeiro para três mil contos e depois para dois mil contos, verba que viria a receber, como ficou provado em tribunal.

Cinco anos depois de ter sido condenado, e perdidos três recursos, Abílio Curto vê estiolarem-se as possibilidades da justiça “andar para trás”, como seria seu desejo por considerar que foram violados os direitos de defesa do arguido, enquanto a prisão efectiva parece estar cada vez mais no horizonte do histórico autarca do PS. A decisão do Constitucional, que confirma confirmando os acórdãos anteriores, não terá surpreendido a defesa, cujos argumentos já tinham saído derrotados no “crivo” da Relação de Coimbra e do Supremo Tribunal de Justiça. A única surpresa do acórdão do TC terá a ver com o facto da decisão final ter sido acompanhada pelo voto de vencida da juíza Maria Fernanda Palma. Uma posição que permitiu à defesa de Curto adiar a efectividade imediata da sentença para Janeiro, altura em que os juizes do Palácio Ratton deverão apreciar o pedido de aclaração, que mais não é que um novo recurso do recurso interposto anteriormente, reforçado com os pareceres de Viera de Andrade e Faria e Costa, professores da Universidade de Coimbra.

E esta deverá ser mesmo a última oportunidade para o ex-autarca fazer valer as suas teses. Se a decisão voltar a ser desfavorável, Abílio Curto não terá outra alternativa e deverá mesmo cumprir uma pena de prisão de cinco anos e meio, depois de lhe ter sido perdoado um ano de cadeia e uma pena de multa. Entretanto, o caso do Matadouro continua pendente de novo recurso para o Supremo depois da Relação de Coimbra ter confirmado em Setembro a pena de prisão de ano e meio aplicada ao antigo presidente da Câmara da Guarda pelo crime de fraude na obtenção de subsídio, estando ainda obrigado a indemnizar o Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas (Ifadap) em 465 mil euros. Outro processo que se figura complicadíssimo para Curto, cada vez mais cercado pela justiça. “O Interior” tentou, em vão, obter um comentário do antigo presidente até ao fecho desta edição.

Uma curta vitória judicial em cinco anos

A suspensão de Abílio Curto das funções de presidente da Câmara, decretada em 97 pelo Tribunal da Guarda, foi considerada ilegal três anos depois pelo Tribunal Constitucional (TC) e é a única vitória judicial do ex-autarca em todo este processo. A decisão reconheceu que o juiz instrutor do processo de corrupção, pelo qual Curto foi julgado e condenado a cinco anos e meio de prisão em Maio de 98, não deveria ter considerado o ex-autarca como um funcionário público, categoria a que se refere o artigo n.º 199 do Código de Processo Penal, suspendendo-o das funções para que tinha sido eleito.

O TC entendeu que há uma diferença entre a profissão de autarca e a de funcionário público e acabou por dar provimento ao teor do recurso apresentado em finais de 1997 por Castanheira Neves. Na altura, o advogado de defesa do ex-presidente pôs em causa as medidas de coacção impostas a Curto, alegando que o seu constituinte estava a exercer um cargo político para o qual tinha sido eleito em 93 com mais de 52 por cento dos votos. E defendeu haver uma aplicação inconstitucional das normas contidas no art.º 199: «Entendo que, no âmbito das funções públicas, não cabem as funções públicas de carácter electivo». Situação que o Constitucional admitiu na sua decisão, dizendo que o mandato de Curto foi mal interrompido. O ex-autarca teve então a possibilidade de ver reposta a totalidade dos seus vencimentos enquanto presidente da Câmara da Guarda que lhe são devidos até ao término do seu último mandato. Uma quantia que será superior a dois mil contos. Contactado na altura por “O Interior”, Curto considerou esta decisão do TC uma «vitória de Pirro», já que o caso do Matadouro ainda aguardava julgamento. No entanto, esta foi a segunda vitória de Abílio Curto em relação às medidas de coacção, uma vez que o Tribunal da Relação de Coimbra já tinha anulado em 97 a suspensão de funções imposta no âmbito do caso do Matadouro e às quais Curto esteve sujeito durante mais de um ano. Na altura, o facto da medida «não poder prolongar-se no tempo para além do prazo de um ano» foi considerado como um «aspecto fulcral» na decisão da Relação em revogar o despacho de 7 de Dezembro de 95 do Tribunal da Guarda. No entanto, o regresso de Abílio Curto à autarquia guardense só não aconteceu porque o juiz instrutor do processo de alegada corrupção, que envolvia dois empresários da cidade, decretou novas medidas coactivas – suspensão de funções, pagamento de uma caução de 20 mil contos e termo de identidade e residência. A primeira acabou por ser considerada ilegal pelo TC.

Luis Martins

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