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A Vingança da Natureza

Em Portugal discute-se a competitividade da nossa economia face à dos parceiros europeus e dos concorrentes externos. Discutem-se também o crescimento do PIB, a crise económica e financeira. Ou a capacidade do nosso tecido industrial, ou empresarial, em fazer frente aos actuais desafios. Dizem-me que, apenas entre a China e a Índia, há 400 milhões de trabalhadores à procura de emprego. Que a China colocou recentemente setenta mil trabalhadores em Angola.

Os acordos de Quioto estipulavam para Portugal um limite de emissão para a atmosfera de dióxido de carbono que se encontra largamente ultrapassado, tanto que teremos de comprar direitos de emissão. Há quem diga que esta obrigação, sendo um sinal de crescimento da nossa indústria, é um bom sinal.

Há também isto: “Devemos recordar que a capacidade a longo prazo de suporte (para a espécie humana) do planeta, com presunções relativamente optimistas acerca do consumo e das tecnologias, equitativamente distribuídos, é de cerca de dois biliões de pessoas. A actual população não pode ser sustentada pelo “rendimento” gerado pelos ecossistemas naturais e está a consumir os vastos recursos de capital natural – especialmente os melhores terrenos agrícolas, as águas subterrâneas e a biodiversidade – acumulados desde tempos imemoriais. Nalguns locais os solos aráveis, que se geram à razão de centímetros por século, estão a desaparecer à razão de centímetros por ano. Alguns aquíferos estão a esgotar-se a dúzias de vezes a razão da sua capacidade de recarga. Embarcámos, pelos vistos, no mais vasto episódio de extinção em 65 milhões de anos – Paul Ehrlich (Sept. 25, 1998)” – tradução minha (e certamente precária).

Há que recordar aqui a infeliz e grotesca história da ilha de Páscoa. Aí aportaram um dia os polinésios e as suas crenças. Estas evoluíram e a população entretanto radicada na ilha cindiu-se em várias tribos concorrentes, todas a procurar apenas para si os favores dos deuses. Para os louvar, e em concorrência com os outros, as diversas tribos iam erigindo gigantescas estátuas de pedra que eram transportadas sobre troncos de árvores abatidas para o efeito. Cada megalito implicava o abate de muitas árvores. Tantas, que pouco a pouco as florestas foram desaparecendo, ao ponto de a ilha se ir transformando num deserto. Um dia abateram a última árvore e nada restou às tribos rivais, para resolverem o seu conflito, senão a guerra. Sem árvores, a terra arável foi sendo arrastada para o mar pelas chuvas. A agricultura foi dando cada vez menos, para cada vez menos pessoas – estas cada vez mais pequenas e mais doentes – e até à extinção final. Sabe-se hoje, para concluir, que os últimos descendentes dos polinésios que colonizaram a ilha de Páscoa morreram como escravos em minas da América do Sul.

Sugestões:

Um livro: Breve História do Progresso (Ronald Wright, Dom Quixote, 2006). Se quiser ler apenas um livro em 2006, leia este. Relata, para além da catástrofe da ilha de Páscoa, a queda dos impérios Assírio e Romano, da civilização Maia, de algumas sociedades do Neolítico. Tiveram todas em comum não fazerem a si próprias a pergunta básica: quanto tempo mais conseguiremos viver assim?

Um site: http://www.dieoff.com/ (há morte para além do défice).

Outro livro: O Caminho Mais Longo (Ewan Mc Gregor & Charley Boorman, Bertrand Editora 2006). Dois amigos, actores famosos de Hollywood, ambos residentes em Londres decidem fazer uma louca viagem de sonho: ir de Londres a Nova Iorque por terra, de mota, atravessando a Europa e a Ásia, cruzando o estreito de Bering para a América para terminar a viagem quatro meses depois. Conhecia um romance de Júlio Verne que contava a aventura de uma família cigana que vai da Terra do Fogo à Europa via estreito de Bering, mas nunca imaginei que alguém tentasse algo semelhante.

Por: António Ferreira

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