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A ver vamos

Parece que no 1.º Encontro de Património Raiano: Centros Históricos de Fronteira, que decorreu na Guarda nos dias 16 e 17, organizado pelos N.A.C., C.E.I e PolisGuarda, se concluiu ser de extrema importância reabilitar o Centro Histórico da Guarda. Essa conclusão, que é tudo menos uma novidade, foi já assumida em todas as campanhas eleitorais autárquicas de que me recordo.

Mas, tendo em conta os intervenientes e as entidades organizadoras, parece agora que vai acontecer algo ou que o próprio encontro serviu para alicerçar alguma “estratégia de intervenção”, para preparar terreno para…

Há uns tempos atrás escrevi neste jornal um artigo centralizado na ideia de que “o que falta é paixão pelo centro histórico”. Esta ausência de paixão exprime-se numa falta de vontade dos guardenses, em geral, e da Câmara Municipal da Guarda, em particular, de se empenharem num processo visível de reabilitação e reconversão do centro histórico, do seu património material e imaterial, da sua realidade urbana, social e cultural.

Essa falta de paixão revela-se nos factos. Foi necessário esperar durante anos por um programa de financiamento para intervir na Praça Luís de Camões e em algumas das principais artérias da cidade antiga. Esta espera deveria envergonhar os sucessivos executivos camarários que dela foram responsáveis. Ninguém aceita a justificação de que nunca foi possível fazê-lo com verbas exclusivamente da autarquia. A verdade é que nunca foi “mesmo importante”, as promessas políticas foram sucessivas falácias. Mas adiante.

Não sei se a vontade chegou mas parece ter chegado uma oportunidade. O Decreto-lei 104/2004, de 7 de Maio, criou um regime excepcional de reabilitação urbana de centros históricos e áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística e prevê, paralelamente, a possibilidade das autarquias criarem S.R.U.´s – Sociedades de Reabilitação Urbana (reguladas pelo regime das empresas municipais). O presidente da C.M.G. manifestou diversas vezes, durante este primeiro ano de mandato, a sua vontade de criar uma S.R.U. Será que é agora, que o Programa Polis se está a esgotar bem como tudo o que a ele está associado, o momento oportuno para tal acontecer?

Aplaudo, a iniciativa, ainda que tardia, de iniciar o processo de reabilitação referido. Condeno o aparente “sentido de oportunidade” de criar mais uma empresa municipal. E porquê?

A Câmara da Guarda possui actualmente recursos financeiros escassos, como é do conhecimento público. A criação de uma S.R.U. obriga a montar uma logística que implica custos acrescidos para a autarquia. Hoje, e dadas as circunstâncias, a criação de uma estrutura dessa natureza, para a área de intervenção do centro histórico da Guarda, só se justificaria se a urgência fosse de tal forma imperiosa para a C.M.G., que justificasse a contratação de altos quadros técnicos (cujos rendimentos não são compatíveis com os de um técnico camarário). Naturalmente, seriam técnicos com provas dadas na gestão de centros históricos e sempre com o objectivo de “executar” em tempo recorde e com resultados de excelência. Mas esta urgência não é uma realidade porque, se a necessidade de pensar o centro histórico fosse prioritária, esta teria sido uma das primeiras iniciativas camarárias a ser tomada, o que não aconteceu.

A verdade é que o Decreto-lei 104/2004 refere, no seu artigo 36.º, que os municípios sem intervenção de S.R.U. podem igualmente seguir o regime excepcional de reabilitação e, assim, aceder aos financiamentos dirigidos para o efeito, como o PROHABITA, por exemplo. Então porque é que num cenário de contenção financeira, a vontade de pensar o centro histórico não se reflecte numa mobilização total de alguns técnicos da autarquia para o efeito. Paralelamente, poder-se-iam contratar alguns serviços de consultadoria na área da Gestão. Relativamente aos arquitectos, engenheiros, historiadores, sociólogos, assistentes sociais, etc. bastava motivar e dar oportunidade aos que estão próximos mas “dentro da casa”. Nesta possibilidade, a criação da S.R.U. passa a ser encarada como secundária e revela-se o fundamental: reabilitar e reconverter o centro histórico. Que não se invertam as prioridades, sob pena de se achar que o interesse público está a ser posto em causa. E neste caso, é muito fácil juntar as peças.

Por: Cláudia Quelhas

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