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A “veia inspiradora” do Feital

Aldeia do concelho de Trancoso recebe Simpósio Internacional de Arte até amanhã

As pedras brancas colocadas ao longo de uma rua estreita encaminham os visitantes até ao atelier “Temos Tempo”, palco da sétima edição do Simpósio Internacional de Arte do Feital. Esta exposição colectiva de arte experimental apresenta vários trabalhos surpreendentes sobre o tema “Desenhar com a Natureza – Desenho o que como”. De resto, os sete artistas que responderam ao desafio lançado por Maria Lino não escondem que o ambiente bastante singular da aldeia do concelho de Trancoso lhes agradou sobremaneira, tendo servido de inspiração para os seus trabalhos.

Yvonne Knevels (Bélgica), Klaus Becker e Sigrun Jakubaschke-Ehlers (Alemanha), bem como os portugueses Ângelo Encarnação, Tierry Simões, Maria Manuela Lopes e Frederica Bastide Duarte são os autores dos trabalhos expostos no atelier “Temos Tempo” até às 20 horas de amanhã na aldeia que tem apenas 44 habitantes. «Isto é muito cansativo, mas o resultado final é extraordinário», frisa a escultora e pintora Maria Lino, a grande mentora deste encontro de arte contemporânea. A artista natural do Feital sublinha a ligação que se estabelece «entre o grupo e o conhecimento mútuo do trabalho e das pessoas que, por vezes, continua para além do simpósio». Os sete criadores presentes foram convidados em 2002, uns porque Maria Lino já os conhecia e outros «através do conhecimento do seu trabalho», explica. Mais artistas foram convidados mas não puderam aceitar o repto que lhes foi lançado. Para o futuro, Maria Lino deseja que o simpósio possa continuar, sendo que a próxima edição deverá acontecer em 2006 já que 2005 servirá para «arranjar um grupo novo e, se possível, apoios para fazer um catálogo», refere.

Como forma de se integrarem no ambiente natural e isolado do Feital, os sete artistas passaram alguns dias de Setembro de 2003 na aldeia. Os trabalhos agora expostos possuem assim uma ligação com a aldeia, até pelas cores dos frutos e outros alimentos que «não são tratados com químicos», mas o melhor exemplo de uma produção «intimamente ligada» ao Feital é a obra de Thierry Simões, intitulada “De 15 a 20 minutos de reflexão (63 graus) pressão do cobre – sobre um sítio de tradução (ou digestão)”. Efectivamente, o jovem artista vai buscar um raio solar projectado por uma chapa que, por sua vez, atravessa um regato simulado, onde está a cadeira do pensador, e chega até à parede onde projecta a sombra de uns paus e das flores ligadas a uma carta escrita em francês. Thierry Simões indica que a ideia surgiu-lhe no Feital, um local que lhe agradou muito. «Esta aldeia é muito bonita e é um sítio inspirador com as pedras, as habitações e as próprias pessoas, que têm muito a ver com a terra», reforça.

Outro dos artistas maravilhado com o ambiente rural do Feital foi o alemão Klaus Becker que fez um trabalho intitulado “O guardador de rebanhos”, que incorpora 109 desenhos sobre papel chinês, com aguarela, cola acrílica e lápis de cor. Entre os desenhos contam-se 22 pinheiros queimados, 22 oliveiras, 22 castanheiros e ainda muitas figueiras. «Quando estava a fazer este trabalho lembrei-me do poema de Alberto Caeiro, que tinha lido há muitos anos na Alemanha. Eu também fiz como os pastores, porque saia todos os dias de manhã para o meio das colinas e da natureza», conta. Klaus gostou tanto do Feital, «um sítio muito simpático e acolhedor» que decidiu trabalhar pela primeira vez com papel chinês, já que «normalmente» trabalha com esculturas e pedras. Uma das obras mais surpreendentes, pela tecnologia utilizada – o vídeo -, pertence a Maria Manuela Lopes. Quanto aos outros trabalhos presentes, a esmagadora maioria são pinturas, em que os autores utilizaram vários tipos de matérias que retratam diferentes objectos, alimentos e árvores.

Ricardo Cordeiro

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