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A relatividade do encanto

Imaginem que Eugénio ia aos Jogos Olímpicos de Pequim e depois Londres e trazia para Portugal 5 medalhas de ouro, 3 de prata e 3 de bronze. Eugénio era uma lenda em Portugal. A vida tem destas fascinantes relatividades. Ryan Lochte tem estas medalhas e é nadador do mesmo grupo de Michael Phelps. Se Phelps não existisse era a maior performance desta olimpíada para um nadador que, nessa ausência, ainda tinha mais ouro e mais prata. Mas o fascínio da vida é exatamente este. Ser segundo não carrega luzes para a ribalta. Imaginem que Lochte tinha vindo para o Algés e Dafundo e era representante de Portugal. Portugal hoje gritava de alegria e ele tinha as capas de inúmeros jornais escritos em português, que mal perceberia. Depois questionei-me sobre medalhados excecionais de países da nossa dimensão, e havia. Encontrei Vera Calavska, da Checoslováquia, com 11 medalhas, Ágnes Keleti, da Hungria, com 10 medalhas, Paavo Nurmi, da Finlândia, com 12 medalhas, Aladar Gerevich, também da Hungria, com mais 10 medalhas. Ou seja, a dimensão do país não tem nada a ver com a performance, muito mais tem a importância, o incentivo, a prioridade que damos ao desporto nos países. O que nos diferencia é a presença de erro nas prioridades, naquilo que consideramos importante. Escolas primárias sem qualquer incentivo ao desporto, sem instalações para desporto, sem professores de Educação Física. Temos, em contraste, os infelizes que carregam os filhos ao sonho de lhes trazerem fortunas no futebol. São os que pretendem ver nos descendentes as performances que nunca tiveram e vão aos campos insultar treinadores e gritar com crianças. O mundo na sua relatividade teve atletas inacreditáveis como Carl Lewis, Usain Bolt, que, tendo medalhas, não carregam uma diarreia delas. Depois há os super desportistas do decatlo moderno, como Ashton Eaton, que quase ninguém conhece e que praticam dez modalidades. A relatividade é realmente fascinante e por vezes deprimente. Hoje, sonhei com Eugénio Lochte e rejubilei com um Portugal diferente.

Por: Diogo Cabrita

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