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«A receptividade dos jovens tem sido extraordinária»

Cara a Cara – Entrevista

P – Como é trabalhar com jovens que, à partida, têm um comportamento problemático?

R – Trabalhar com jovens requer sempre uma atitude especial. De uma forma geral, todos têm um comportamento problemático, ainda para mais quando se fala de jovens de 16/17 anos. Infelizmente, as suas expectativas não podem ser concretizadas muitas vezes. Agora, reconheço que estes jovens com quem estou a trabalhar têm uns problemas extra que a nós, socialmente, nos parecem bastante mais graves e serão concerteza. Para além disso também são pessoas que, de uma forma ou de outra, não estão socialmente integradas. A lógica deles poderá ser uma outra que não aquela a que estou acostumado. Então, o grande desafio é eu conseguir aproximar-me deles e isso é uma coisa que se vai construindo dia-a-dia, vão-se ganhando pequenas batalhas de comunicação.

P – Qual tem sido a receptividade demonstrada pelos jovens até ao momento?

R – Tem sido extraordinária. Estão inseridos num ambiente onde as oportunidades de se encontrar gente diferente não são muitas. São sempre as mesmas pessoas que lá estão e quando aparece alguém novo, com uma ideia nova, ainda por cima sugerido pelo teatro e pela própria direcção do Centro Educativo do Mondego, eles mostram-se 100 por cento receptivos.

P – Não considera então arriscado embarcar num projecto deste tipo, no sentido de não conseguir obter o sucesso pretendido?

R – A mim esse sucesso não me perturba, nem sequer é o objectivo. O objectivo neste caso é mais o trabalho com nove jovens e chegar a um produto final é uma consequência de um mês de jogos e de uma outra animação, de uma outra ideia de comunicação que não aquela a que eles estão habituados, assim como eu.

P – O resultado final desta peça pode surpreender o público?

R – Vai surpreender concerteza. Eu não sou uma pessoa muito dada a uma lógica linear de espectáculo. Isso não me interessa. Prefiro uma coisa que seja mais de construção, que seja surpreendente. Às tantas não o vai ser porque é uma coisa extraordinariamente boa, mas vai ser uma coisa extraordinariamente boa de certeza para as pessoas que vão ver por não suspeitarem que as coisas corram da forma como vão decorrer.

P – Já se pode saber qual é o ponto de partida da peça?

R – Eu gostava de o dizer, mas também não sei. É um projecto absolutamente em construção. Ainda não é possível ter a definição do que vai suceder. No fundo, o que estamos a fazer é, a partir de jogos, ir construindo pequenas frases como se fossem pequenas curta-metragens que depois vão ser postas numa sequência que vai dar a um ponto só. Portanto, ainda não posso adiantar grande coisa.

P –Como considera que está a decorrer esta experiência até agora?

R – Está a correr muito bem. Estou muito surpreendido com o que está a acontecer, não só pela parte dos jovens, mas também pela minha, porque eu estou a ficar igualmente surpreendido com aquilo que vou conseguindo oferecer às pessoas que me rodeiam, neste caso estes jovens do Centro Educativo do Mondego.

P – Em sua opinião, o que mudou na Guarda com a abertura do Teatro Municipal da Guarda?

R – Ainda é muito cedo para uma pessoa perceber o que está a acontecer. No que me diz respeito, eu estou aqui há duas semanas e a minha vida já fica toda muito mais agradável, isto porque há um teatro, que ainda por cima tem uma série de coisas que o rodeiam, como os vídeos e espectáculos no café-concerto, por exemplo. Nós devíamos ter o hábito de ir para os teatros, assim como eu venho a este. Venho aqui tomar café, vou ali ver um espectáculo… Hoje vou agarrar nos meus sobrinhos e venho ver o cinema. É isso que é muito importante. A Guarda era um desespero porque não havia sítio nenhum onde se podia estar, já que mesmo os cafés antigos foram todos destruídos. Não havia nenhum local onde as pessoas pudessem estar umas com as outras, comunicar e ter ofertas de materiais culturais. Com a abertura do TMG, para mim, é uma diferença do dia para a noite. Eu, por exemplo, acho que não faria sentido nenhum vir para a Guarda passar um mês se não houvesse este teatro. Iria sentir-me completamente perdido nesta cidade.

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