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A Raia não é só capeia, mas também…

Opinião

Chega o mês de agosto e com ele chega também uma nova vida à zona raiana do Sabugal. As aldeias que, em tempos, foram já cheias de gente a tempo inteiro, voltam a receber os seus filhos migrantes e emigrantes, multiplicando por muito o número habitual de habitantes. Como em tempos escrevi a Raia é uma espécie de Algarve do interior e, ano após ano, como devotamente se vai para a praia, também acontece o mesmo com a Raia.

É certo que a chamada existiria sempre, como acontece noutras zonas do país. No entanto, por aqui não é só o encontro, as festas religiosas e a sua componente popular, é um fenómeno único que faz com que as pessoas permaneçam mais dias e convivam, de terra em terra, num habitual peregrinar entre encerros e capeias.

A capeia arraiana, que esteve há algumas décadas quase confinada a um pequeno território do concelho do Sabugal, ganhou, também por força da sua classificação como Património Cultural Imaterial, uma nova vida. Este fenómeno é, por estranho que pareça, oposto ao despovoamento que é crescente, como se este renovar da tradição acontecesse como raízes que desesperadamente se agarram à terra.

A verdade é que há muitos anos por todo o território de Ribacôa se realizavam folguedos com touros, tendo-se verificado que muitas dessas localidades tinham deixado praticamente de lado esse ritual de cultura popular.

O Festival do Forcão e a rivalidade arraiana permitiram que a tradição não morresse e, de certo modo, se desenvolvesse. Foram várias as localidades onde surgiram infraestruturas fixas para a capeia arraiana e outras manifestações, casos de Aldeia da Ponte, Rebolosa, Soito, Vale de Espinho, Ozendo e recentemente Quadrazais. Também naquelas em que a praça continua a ser montada no largo da respetiva localidade, das quais Aldeia Velha continua a ser o expoente máximo com os tradicionais carros de bois, foram melhoradas as condições quer para os animais quer para as pessoas.

A capeia, enquanto manifestação taurina popular, continua a ser a mesma com o tradicional forcão e todos os rituais associados: corte do forcão, fazer o forcão, montar a praça, contratar o gado, fazer o passeio e tudo o mais que lhe está associado, nomeadamente esperar os bois ao forcão “como deve ser”.

Apesar deste crescente interesse é possível estabelecer uma hierarquia, a qual nos coibimos aqui de enunciar, mas que toda a Raia conhece, numa espécie de campeonato da primeira, segunda, terceira e até quarta divisões, culminando com o que já se designou como “Campeonato do Mundo do Forcão”, o Festival do Forcão. E esta hierarquia não tem nada que ver com o tamanho das aldeias ou o efetivo de habitantes, mas antes a sua grandeza na tradição.

A primeira divisão começa dia 6 na Lageosa da Raia e termina no dia 25 em Aldeia Velha. Pelo meio fica um extenso leque de “manifestações com touros” para quem quiser marcar encontro com uma tradição única e autêntica.

Para terminar, convém dizer que o Sabugal não é só capeia e são mais que muitos os motivos para fazer uma visita, mas com este já não era pouco.

António Pereira de Andrade Pissarra *

* co-autor do livro “Terras do Forcão”

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