Arquivo

A propósito do transporte ferroviário*

Numa linha ferroviária tanto circulam comboios de mercadorias como de passageiros. Esta frase poderá ser verdadeira se as características que influenciam um projeto de uma linha ferroviária fossem iguais quer para o transporte de mercadorias, quer para o transporte de passageiros. Tal não acontece, e a decisão de qual escolher, ou ambas, é de extrema importância. O sistema ferroviário é um sistema complexo, mas se for estudado na sua globalidade tem um potencial imenso ao longo da sua vida útil.

Os modelos de conceção, construção e exploração de um troço ferroviário devem ser, sob pena de grandes prejuízos económicos, muito bem fundamentados e estudados. Não existe uma receita única ou um modelo perfeito. O paradigma da via férrea tradicional mudou. Muito devido ao aumento de velocidade que se impôs no transporte de passageiros. E mudará ainda mais aquando do agravamento das restrições ambientais ao transporte rodoviário. A justificar isto existem os modelos dos países onde o sistema ferroviário é altamente desenvolvido e usado. Por exemplo, no famoso e histórico troço Paris-Lyon do serviço TGV só circulam comboios de alta velocidade. Já nas linhas de alta velocidade alemãs circulam comboios de passageiros e de mercadorias.

Portugal discute agora alguns projetos onde este binómio está presente, uma vez que a vontade de dar à economia competitividade no transporte de mercadorias é muita. O mesmo não parece estar a acontecer com o transporte de passageiros, onde talvez os constantes erros na política rodoviária parecem levar a uma situação de não se poder gastar mais dinheiro no transporte de passageiros. Se de facto a situação económica e as condições ótimas de infraestruturas rodoviárias sustentam tal tese, também não deixa de ser verdade que é nas grandes decisões que pode estar a possibilidade de mudança do paradigma atual, com o objetivo de o ajustar às necessidades das pessoas e da economia.

O tão falado corredor Aveiro-Vilar Formoso é visto como chave para a exportação de mercadorias, por ligar o porto de Aveiro ao resto da Europa. Serão aproximadamente 250 km de ligação (largura de Portugal). Globalmente, estes 250 são essenciais, pois concluem a ligação. Particularmente esta ligação parece-me ser muito importante no alavancamento do transporte ferroviário de passageiros em Portugal. Poderia resolver graves lacunas da linha da Beira Alta e permitir a modernização das cidades nesse corredor (Aveiro, Viseu, Guarda).

Existe um enorme potencial de crescimento também no transporte de passageiros e de modernizar a rede ferroviária nacional. Aliás, esta ainda está muito aquém de uma rede moderna de transporte de passageiros europeia. E talvez não seja necessário circular a 300km/h para conseguir padrões ótimos de tempos de viagem, conforto e oferta de serviço.

* Título da responsabilidade da redação

André Pina, Guarda, carta recebida por email

Sobre o autor

Leave a Reply