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A nova vida dos dinossauros

Editorial

1. A descoberta de uma gralha na lei de limitação de mandatos foi a mais anedótica das notícias dos últimos dias.

Depois de semanas de debate sobre o impedimento legal ou não dos “dinossauros” do poder local se poderem recandidatar, eis que, desde a Presidência, se chega à descoberta de que o texto da Lei de Limitação de Mandatos publicado em 2005 em “Diário da República” (“DR”) não corresponde ao que foi aprovado pela Assembleia da República e promulgado por Jorge Sampaio, o então Presidente da República.

O texto que está publicado impede que o presidente “de” câmara ou “de” junta de freguesia que já tenha cumprido três mandatos sucessivos possa recandidatar-se. Mas a lei aprovada defendia esse impedimento para o presidente “da” câmara ou “da junta. A publicação em “DR” terá pois uma gralha que vem alterar a respetiva interpretação. Um erro que põe em causa a própria credibilidade do “DR” e que deverá permitir que muitos autarcas se possam recandidatar. Os que temiam que a interpretação do Tribunal Constitucional fosse contrária aos seus interesses respiram fundo e avançam, pois é mais provável que o Constitucional conclua que a redação correta determinaria que o legislador pretendia o impedimento de recandidatura à mesma câmara sem vedar ao candidato a possibilidade de o fazer noutro concelho.

O absurdo de toda esta rocambolesca situação é que o espírito da lei fica completamente destruído. Aliás, nem se entende muito bem todo o debate à volta do assunto, pois, obviamente, só havia uma intenção no legislador: os autarcas com mais de três mandatos sucessivos não podem candidatar-se a um quarto mandato, seja onde for. Nem se percebe como pode haver outro entendimento. Mas entretanto eternizam-se alguns “dinossauros”.

2. A baralhação provocada pela interpretação da Lei de Limitação de Mandatos abre as portas a Álvaro Amaro para se candidatar à Câmara da Guarda pelo PSD. O ainda edil de Gouveia mostrava disponibilidade, mas não avançava, entre outras razões, por saber que haveria providências cautelares a reclamarem a sua inibição, e que depois o Tribunal poderia impedir a sua candidatura. Agora é improvável que o Tribunal decida negativamente. Amaro aponta para a Guarda com os olhos postos na Beira Interior Norte e Serra da Estrela – e a contar com o apoio do CDS/PP.

Manuel Rodrigues teve tudo para se impor, exigiu a unanimidade do partido, quando lhe bastava marcar o terreno e esperar, esperar mas sem desistir, nem impor condições. Ao impor um deadline ficou sem espaço e perdeu, para voltar à liça teve de fazer uma pirueta: foi candidato, deixou de o ser, para depois o voltar a ser sem explicar o que é que tinha mudado entretanto (e não mudou nada).

O PSD avançou então com uma sondagem entre os dois putativos candidatos. Álvaro Amaro ficou à frente de Manuel Rodrigues nos diferentes itens estudados. Mas, ainda assim, e como se previa, até olhando para os estudos de opinião anteriores (e cujos resultados foram quase decalcados nesta nova sondagem…), a diferença para o PS é grande. José Igreja leva cerca de oito pontos de vantagem para Amaro e dez para Rodrigues. Em campanha pode mudar muita coisa, mas não será fácil inverter a baixa popularidade do PSD e, ainda mais difícil, fazer sarar as feridas abertas entre as diferentes fações laranjas – como há quatro anos, o adversário será o PS, mas os inimigos estarão no PSD, os que perderam a contenda da escolha de candidato e que irão perseguir a candidatura laranja de Álvaro Amaro (de resto, a concelhia da Guarda anunciou que se o candidato fosse de fora… estariam contra. Como há quatro anos. Os mesmos e a mesma atitude). Tudo muda, menos o PSD da Guarda. Só a eventualidade de uma candidatura independente protagonizada por Virgílio Bento poderá levar a alterações ao figurino habitual das autárquicas no concelho – improvável mas apetecível.

Luis Baptista-Martins

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