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A Guarda Republicana

Anotações

No próximo dia 2 de dezembro assinalam-se 103 anos após a chegada dos primeiros elementos da Guarda Republicana à cidade mais alta de Portugal, ato que foi festivamente assinalada pelas entidades locais e população citadina.

O dia 2 de dezembro de 1914 «estava de rigoroso inverno, caindo uma chuva impertinente», como noticiava o jornal “O Combate”, editado na Guarda. Contudo, nem as condições atmosféricas adversas impediram de afluir, à entrada da cidade, «muito povo com a bandeira da Infantaria nº 12, irrompendo em manifestações entusiásticas ao chegar da força», que era comandada pelo capitão Cesário de Augusto d’Almeida Viana.

Os elementos desta companhia (4ª de Infantaria), e de acordo com o que divulgou a imprensa citadina, foram, depois, distribuídos por Aguiar da Beira, Almeida, Celorico da Beira, Figueira de Castelo Rodrigo, Fornos de Algodres, Vila Nova de Foz Coa, Gouveia, Guarda (12 de cavalaria e 22 de infantaria), Manteigas, Meda, Pinhel (6 de cavalaria e 8 de infantaria), Sabugal, Seia e Trancoso.

Na Guarda parte dos elementos da força ficaram no edifício da Câmara Municipal (onde funciona atualmente a Escola de Santa Clara) e os restantes nas instalações do antigo «colégio jesuítico», hoje Paço Episcopal, na Rua do Encontro; refira-se que a 31 de outubro de 1914, e de acordo com a ata da Comissão Executiva da Câmara da Guarda, tinha sido pedida, à «Comissão de Execução da Lei de Separação do Estado das Igrejas, a cedência da casa onde esteve o colégio das Irmãs Doroteias», na altura desabitada, «para instalar provisoriamente a Guarda Republicana» até que fossem concluídas as obras de adaptação que a autarquia estava a realizar.

Nessa época, a cidade era uma «aldeia grande, com as mil deficiências que caracterizavam os pequenos burgos do interior: seriam pouco mais de seis mil os seus habitantes, acantonados no velho bairro de São Vicente, com a cidade nova a querer romper pelo Campo de S. Francisco, Bonfim e Arrabalde», como escreveu José Maria de Almeida. Descrevendo, depois, o quadro citadino, o articulista refere-se a uma terra quase parada no tempo. «Sem água canalizada, sem esgotos, com os deficientes hotéis de Abel Ferreira de Abreu (Hotel Central) e de José António dos Santos (Hotel Santos), a luz elétrica de fraca potência, escasso policiamento, sem cafés modernos, apenas com a recriação oferecida pelo Teatro dos Bombeiros, pelo Club Egitaniense, frequentado pela alta burguesia, e o Grémio Sande e Castro pelos caixeiros, pequenos comerciantes e funcionários públicos, a Guarda era, tinha de ser mesmo, uma cidade morta, polvilhada de tuberculosos, espalhados pelas casas de doentes, como a da Tamanqueira, da Etelvina ou da Chica, modestas e deficientes pensões, situadas à ilharga da cidade».

A esta realidade acresciam o clima político e social subsequente à implantação da República, numa cidade onde se desenrolaram, ao longo dos anos seguintes vários episódios que testemunharam múltiplos antagonismos.

Nos jornais de matriz republicana, publicados antes e depois da data que marcou um novo ciclo na história política portuguesa, encontramos textos de grande lucidez e reflexões apaixonadas, a par de uma preciosa informação sobre o pulsar da vida local, sobre o papel interventivo de muitas personalidades, sobre as estratégias dos grupos que detinham ou pretendiam o poder, sobre as divergências pessoais ou de grupos. Da leitura e do estudo, crítico, destes jornais poderemos evoluir para um conhecimento mais completo de um período em que o mapa político e institucional do distrito da Guarda era palco de grande efervescência e outrossim de mudanças.

Neste contexto, melhor se compreendem o significado e a importância da vinda da Guarda Republicana.

A partir desta histórica data, a Guarda Republicana abriu um novo ciclo no policiamento e segurança do distrito, mais tarde com novos postos e seções. Em 1917 a 4ª Companhia passou a integrar as seções da Guarda, Pinhel e Gouveia; a partir de 1920, e já integrada no Batalhão nº 5, com sede em Coimbra, foram sendo instalados novos postos.

Decorridos estes 103 anos, a GNR continua bem presente na Guarda da região e da sua divisa, alimentando ainda, certamente, o sonho de melhores instalações e condições para quantos integram esta força de segurança.

Por: Hélder Sequeira

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