Arquivo

«A grande dificuldade é explicar e tentar levar as pessoas a aprenderem a ver»

Cara a Cara – Maria Lino

P – Ao fim de vinte anos, o que tem permitido continuar a organizar este Simpósio numa aldeia do interior?

R – No próximo ano o Simpósio comemora 20 anos, pois repete-se sempre no ano seguinte, Ou seja, o primeiro ano é fechado ao público, em que os artistas trabalham três semanas sem visitas exteriores e, no segundo ano, a terceira semana é aberta às pessoas. O primeiro Simpósio realizou-se em 1995, quando eu ainda estava em Hamburgo. Vim em 1997 e a partir daí tem sido regular. Quando não existia apoio havia um ano de intervalo e, por isso, são 20 anos. No entanto, o simpósio que se realiza a partir do dia 7 deste mês é o XIVº. O que tem permitido continuar a organizar é a paisagem extraordinária do Feital, o silêncio… Agora, a Associação Luzlinar tem um espaço de seis hectares, ao qual chamamos o “Jardim das Pedras” e que é um lugar de meditação, de contemplação e de manutenção, onde todos os artistas ficam entusiasmados e com vontade de ficar. Existe uma ligação muito forte com a natureza, onde a compreendemos. Não se trata de copiar mas sim de perceber como esta se transforma com as estações do ano, bem como o clima. Acompanhamos e compreendemos essa transformação, até porque nós próprios também nos transformamos paralelamente à natureza porque somos dependentes do clima e dessas coisas.

P – O que vamos poder ver nesta XIVª edição?

R – Trabalhos dentro do atelier e elaboramos projetos para trabalhos. Ao longo da paisagem, até ao “Jardim das Pedras”, que são mais ou menos 15 minutos a pé, a subir a serra, há várias intervenções dos artistas, por exemplo, um vai colocar lâmpadas de energia solar e à noite poderemos ver uma pedra enorme iluminada de baixo para cima. Vamos ver também sítios onde tudo foi limpo à volta das pedras, para se ver bem a pedra. Os desenhos também se incluem no projeto de trabalho, bem como outros trabalhos. A grande dificuldade para mim é explicar e tentar levar as pessoas a aprenderem a ver, pois implica observar como se fosse pela primeira vez, sem dar nome às coisas. As pessoas estão habituadas a ver tudo com rótulos e depois deixam de observar como se fosse pela primeira vez.

P – Como foi escolhido o tema deste ano, “Vento Fogo”?

R – São dois elementos que estão ligados, quando há um fogo este fica dependente do vento e aqui na serra do Feital isso é muito comum. O vento transforma a paisagem, com o movimento da vegetação, das árvores e com a nossa reação ao próprio vento.

P – Quais as dificuldades que existem em organizar um Simpósio Internacional?

R – As dificuldades estão em conseguir fundos, pois em três semanas vamos ter quatro artistas portugueses e quatro da Alemanha. É preciso dar alimentação e dormida. Tem de ser tudo muito bem organizado e essa organização está sempre dependente dos apoios.

P – Quais os apoios que têm neste momento?

R – Um simpósio destes ronda os 15 mil euros. Os apoios que temos vêm da Direção-Geral das Artes, da União de Freguesias de Vila Franca das Naves, das Câmaras de Trancoso e do Fundão. Esta última é mais para as atividades que são realizadas naquela localidade e no concelho. O problema está nas autarquias pagarem quando precisamos do montante.

P – Está previsto realizarem uma retrospetiva com os trabalhos produzidos no Simpósio?

R – Já temos catalogados os trabalhos que até agora têm sido realizados no Feital. Peço sempre a cada artista para deixar o seu trabalho em papel, e pequeno para o poder guardar bem. Nos primeiros anos consegui fazer uma exposição na Sociedade de Belas Artes, em Lisboa, com trabalhos meus e de artistas do Simpósio. Mas uma exposição programada, com os mesmos, de momento ainda não temos, mas com certeza que um dia se fará. Temos essa ideia e até de levar a exposição a outros sítios, tanto em Portugal como no estrangeiro. Já tivemos uma exposição em Hamburgo com trabalhos meus e de Sérgio Taborda, um artista português que está em Berlim; de Doris Cordes-Vollert, uma colega alemã que já participou em vários Simpósios; e de Susana Becker, que também já trabalhou aqui.

Perfil:

Coordenadora do Simpósio Internacional de Arte do Feital

Profissão: Escultora

Idade: 71 anos

Naturalidade: Feital (Trancoso)

Currículo: Expôs em Lisboa, Porto; Estudou na Escola Superior de Belas Artes de Hamburgo; Coordenadora do Simpósio Internacional de Arte do Feital desde 1997.

Livro preferido: “A Jangada de Pedra”, de José Saramago

Filme preferido: “Cavalo Dinheiro”, de Pedro Costa

Maria Lino

Sobre o autor

Leave a Reply