Arquivo

«A Feira de São Bartolomeu está na génese do perfume da tradição comercial de Trancoso»

António Oliveira, presidente da direção da AENEBEIRA

P – Quais as expectativas para mais uma edição da secular Feira de São Bartolomeu?

R – Partimos sempre para cada edição da Feira de São Bartolomeu com as melhores expetativas possíveis em relação ao decurso do evento, tendo porém bem presente que vivemos tempos de alguma dificuldade e em que, naturalmente, o tecido económico da região também se ressente do ambiente económico geral em que vive o país. No entanto, face à procura que tivemos por parte de um conjunto de setores de atividade económica, as expetativas com que partimos não são otimistas, esfuziantes, mas são razoáveis porque entendemos que a Feira teve o reconhecimento da sua importância e da sua dinâmica por parte do tecido económico.

P – Em termos de visitantes, tem algum número estimado que gostaria de atingir?

R – Temos as expetativas com que partimos habitualmente para esta Feira e, tendo ela a duração de 10 dias, nós, à semelhança do ano passado e de há dois anos, contamos ter, ao longo do certame cerca de 150 mil visitantes. Costuma vir mais gente à noite, mas também as duas sextas-feiras, sábados e domingos são dias em que há sempre muita gente durante todo o dia.

P – São esperados visitantes não só da região, mas também os muitos emigrantes que por esta altura estão cá de férias?

R – Naturalmente que a Feira conta não só com a população da região nestes concelhos todos, desde o distrito da Guarda ao norte do distrito de Viseu, como com a comunidade emigrante que está entre nós ao longo deste mês e que habitualmente frequenta a Feira.

P – Qual é o investimento global da Feira?

R – Este ano a Feira nas duas diferentes valências tem um orçamento que reflete os tempos em que vivemos. No ano passado, dividido entre o esforço da Trancoso Eventos e a parte suportada pela AENEBEIRA, foi de 285 mil euros mais IVA. Este ano, e sinal dos tempos, temos um orçamento de 238 mil euros mais IVA, ou seja, o contexto atual levou-nos a ter que trabalhar e partir para esta feira com um orçamento inferior ao do ano passado em 47 mil euros. Naturalmente que isso se refletiu essencialmente no cartaz de espetáculos. Mesmo assim pensamos que temos um bom cartaz.

P – Quais as noites em que são esperadas mais pessoas?

R – Temos alguns grupos nacionais e salientava fundamentalmente os espetáculos de dia 14, com Rodrigo, e dia 15, com Emanuel. São dois grandes concertos e destaco também os últimos três com os Canta Brasil, no dia 18, Pedro Abrunhosa, dia 19, e Rita Guerra no dia 20.

P – Quais as receitas previstas em termos de cobrança de bilhetes?

R – A receita é arrecadada pela Trancoso Eventos, uma vez que a gestão do processo de espetáculos é da responsabilidade da empresa municipal, mas a expetativa da arrecadação de receitas em termos de bilheteiras andará entre os 45 e 50 mil euros.

P – O preço dos bilhetes não será o mesmo para todos os espetáculos?

R – Não. Este ano o preço dos bilhetes é claramente diferente. O primeiro dia tem bandas locais e a entrada é livre, à semelhança do último dia que terá durante a tarde um festival de folclore e música tradicional ao início da noite. Depois no dia 13 com uma banda local e os Mundo Secreto, uma banda rap do Porto, com o Rodrigo no dia 14, o Tributo aos Beatles no dia 16, o grupo Chave D’ Ouro no dia 17 e os Canta Brasil no dia 18, a entrada terá um custo de 1,50 euros por pessoa. Há apenas três dias em que a entrada custa três euros. Em suma, temos o primeiro e o último dia gratuitos, cinco dias em que a entrada custa 1,50 euros e apenas três dias em que o bilhete custa três euros.

P – A crise poderá afetar o sucesso da Feira?

R – Penso que a Feira vai ter o mesmo número de visitantes, mas provavelmente algumas das pessoas que a visitam quererão fazer alguma contenção de despesa. Há uma retração generalizada no consumo e isso também se vai refletir seguramente na Feira, mas nós estamos otimistas. A Feira de São Bartolomeu é um momento de dinamização económica de Trancoso, do comércio local ao longo destes dias porque traz muita gente e esperamos que tenha um papel positivo na atividade económica da cidade, como é habitual em agosto.

P – Continua a haver uma grande procura por parte dos agentes económicos em querer estar na Feira?

R – Vamos ter uma Feira em que o número de agentes económicos será muito semelhante ao do ano passado, num total de cerca de 160 nos diferentes setores. Vamos ter expositores na área de diversões, de artesanato, automóveis, maquinaria agrícola e na mostra de atividades económicas, além das tasquinhas típicas. Serão menos cinco agentes económicos do que na Feira anterior, distribuídos por cerca de 225 lotes ou stands, sendo que no ano passado o número andou pelos 230. Há aqui uma ligeira diminuição de cinco cinco stands que se verificou mais na mostra de atividades económicas, que se realiza no Pavilhão Multiusos, do que no resto da Feira. No resto do espaço tivemos uma procura enorme de lotes para exposição no setor automóvel à qual não conseguimos responder na totalidade. Tivemos que responder negativamente a muitos expositores, alguns dizendo-lhes que já não havia lotes, a outros que pretendiam dois lotes, dizendo-lhes que só tínhamos um. Esse foi um setor de procura muito superior, se calhar pela necessidade de expor e de forçar a venda de viaturas novas e/ou usadas. No setor da maquinaria agrícola, a procura foi idêntica à do ano passado e nas tasquinhas típicas, penso que há mais uma ou duas unidades. No artesanato e nos bazares é o mesmo número e nas diversões também há um pequeno acréscimo. Na mostra de atividades económicas é que penso que há menos quatro stands.

P – Há menos porque houve menos interessados?

R – Sim, houve uma ligeira quebra e no Pavilhão Multiusos vão estar menos quatro ou cinco expositores.

P- Há novidades em relação a edições anteriores?

R – O “lay-out” é exatamente o mesmo. As novidades em si são uma coisa que não controlamos. A panóplia de diversões é semelhante e as novidades estão mais relacionadas com a atividade privada. Os expositores é que são responsáveis por aquilo que trazem de novo para a Feira e nós não conhecemos, a priori, o que muitos dos expositores vão expor e portanto é-nos sempre difícil responder a essa matéria. Do que tem a ver com a organização, o “lay-out” da feira é semelhante e não há nesse aspeto nenhuma alteração de monta.

P – Esta é a primeira edição da Feira desde que o IP2 abriu. Pode ser uma mais-valia para atrair mais público?

R – Naturalmente que sim. O IP2 melhorou claramente a acessibilidade a Trancoso e esperamos que o facto de hoje percorrermos o espaço entre o nó da Guarda da A25 e a saída do IP2 em Trancoso em cerca de 15 minutos contribua para um maior afluxo de pessoas não só da Guarda, mas também de outros concelhos e regiões. Com a abertura de alguns troços a Norte, também esperamos que isso se reflita. Infelizmente, o mesmo já não poderemos dizer da Nacional 226, que deverá ser substituída pelo IC26, mas cuja construção, com a situação que o país vive, deverá ficar para tempos não muito próximos, diria até muito longínquos.

P – Passados tantos séculos, a feira continua a afirmar-se na região, como explica isso?

R – Esta Feira está claramente enraizada nos costumes e tradições desta região do norte da Beira e até de uma certa região do Douro e do nordeste transmontano. Quando foi criada, era um momento em que as populações desta vasta região utilizavam para vender os seus produtos agrícolas, as suas produções, o seu gado e era também a oportunidade de, efetuando a venda dos seus bens, adquirirem os produtos que necessitavam para o inverno, quer em termos de agasalhos, quer de manutenção do seu bem-estar físico. Durante séculos a Feira teve esta função, começou por durar cerca de 15 dias, e hoje com o processo de reestruturação que a Câmara de Trancoso, em parceria com a AENEBEIRA, levou a cabo nos princípios dos anos 90, a Feira tem fundamentalmente uma componente lúdica e de exposição e de mostra de atividade económica. Aliás, o caminho seguido pela Feira de São Bartolomeu foi o mesmo que tomaram outras feiras francas do país, como a de São Mateus. Hoje a Feira de São Bartolomeu é fundamentalmente um momento de lazer pela parte lúdica, diversões, espetáculos, gastronomia e de um conjunto de mostra de atividades económicas. Acresce ainda a Feira do artesanato, que acarinhamos profundamente, não só para o apoiar, mas também porque é algo que urge defender enquanto tradição e contribuir para a sua viabilização enquanto atividade económica. No fundo, esta Feira adaptou-se aos tempos.

P – Continua a ser uma Feira de grande importância a nível regional?

R – É uma Feira de grande importância no contexto regional como sempre e está profundamente enraizada nas tradições populares das populações desta região toda entre acima do Douro até à Serra da Estrela que aqui se deslocam nesta altura porque é tradição. Esta é seguramente a Feira Franca mais antiga do país e partimos sempre para ela, mesmo num contexto negativo como aquele que se vive na economia nacional, com a maior das boas vontades e com uma expetativa positiva. É um evento que mobiliza, é importante para Trancoso porque tem muito a ver com o perfume da tradição comercial da cidade que se inicia pelo estabelecimento aqui nos finais do século XII, inícios do século XIII, de uma importante comunidade judaica. Toda esta dinâmica de feiras e mercados é algo que está na génese daquilo que é a atividade preponderante, secular e tradicional de Trancoso e no centro detra tradição está a “jóia da coroa” que é a Feira de São Bartolomeu, que foi o primeiro grande evento económico que logo no início do século XIII os reis de Portugal aqui quiseram localizar. Ainda hoje Trancoso tem um movimento comercial claramente anormal na restauração ou cafés muito associado à realização do certame e isso é algo que queremos manter.

P – A reestruturação do formato da Feira foi essencial para a dinâmica que tem hoje?

R – No final dos anos 80 a Feira estava moribunda porque era anual e estava esgotada, pois decorria nos moldes tradicionais como decorriam os nossos mercados semanais. Penso que foi um desafio ganho. A Feira ganhou um novo fôlego e se nada tivesse sido feito teria pura e simplesmente desaparecido e limitar-se ao mercado semanal na sexta-feira mais próxima. A feira semanal também é um momento de grande importância para Trancoso e vai ver as suas condições de funcionamento melhoradas. Estamos neste momento a requalificar o campo da feira semanal. Era nosso objetivo no final do mês de Julho ou no primeiro mercado de Agosto já ali ter a feira organizada de forma diferente com o espaço devidamente requalificado, as ruas pavimentadas, os lotes perfeitamente definidos para os diferentes feirantes, iluminação e com uma bateria de casas de banho. Não foi possível a intervenção estar já terminada, está neste momento em conclusão e vamos durante o mês de setembro novamente relocalizar e proceder ao sorteio dos diferentes lotes para os feirantes montarem as suas tendas. Não tenho a menor dúvida de que vamos ter uma feira semanal com vantagens claras para o público e para os feirantes. Será muito mais cómodo transitar e percorrer a feira, uma vez que o espaço terá outro tipo de condições e esta é também uma forma de Trancoso dizer que a sua feira semanal é uma aposta importante e que não paramos de tentar melhorar e requalificar porque sabemos bem da sua importância económica.

«A Feira de São Bartolomeu está na génese do
        perfume da tradição comercial de Trancoso»

Sobre o autor

Leave a Reply