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A doença do SNS

Agora Digo Eu

Afirmar que o SNS está doente é um lugar-comum. Afirmar que o SNS está em crise é outro lugar-comum. Afirmar que a saúde está doente, também.

Na passada semana discutiu-se no Parlamento a lei de bases da saúde, pois a atual, com data de 1990, continua a ser o grande problema quando atribui papel (quase) principal aos privados.

No país de brandos costumes onde mais de um terço da população está isenta do pagamento de taxas moderadoras, por insuficiência económica, as famílias portuguesas pagam 34% da despesa total do país em saúde. Os grupos BES, Melo, Lusíada e Trofa detêm 60 unidades controlando mais de 60% da saúde em Portugal, gerindo quase metade das unidades de saúde.

Com a “troika” e já no pós-troika, atendimentos, consultas, exames complementares de diagnóstico diminuíram nos hospitais públicos tendo aumentado significativamente no privado. A redução de camas no público, uma realidade, menos 3.000, aumento de mil e tantas no privado. E como sempre as célebres PPP’s a darem a sua “caridosa” ajudinha. A despesa com recursos humanos ficou muito abaixo de qualquer país europeu. Há medicamentos inovadores que não entram no SNS, existindo uma divida de 1.600 milhões de euros, já vencida, à indústria farmacêutica.

E que dizer do aumento de tempo para as cirurgias e as listas de espera a somarem cada vez mais tempo, o que dá para perceber que é obrigatório haver outras e novas abordagens políticas. E depois temos administrações (muitas delas nomeadas apenas e tão só pela cor do cartão partidário) sem dinheiro, chegando a ser racionadas coisas básicas como sejam almofadas e lençóis…

No caso da Guarda verificam-se carências estruturais que determinam a existência de inúmeras pessoas sem médico de família e, independentemente de toda a boa vontade, a lista de espera em Ortopedia é de dois anos e em Oftalmologia também, tendo o serviço de Pediatria as piores instalações do país.

O poder político acena-nos agora com uma proposta de revisão da lei de bases da saúde, feita por encomenda, deixando a porta aberta a novas PPP’s, pese embora os orçamentos possam vir a ser plurianuais. De realçar que as tais parcerias público privadas, grandes responsáveis pelo caos instalado, na ótica da grande maioria da população, devem existir única e exclusivamente por exceção e nunca por e como regra e esta revisão que aceita o princípio universal do acesso à saúde, constitucionalmente definido, deve apostar no investimento em recursos humanos, equipamentos, infraestruturas, diminuindo o esforço financeiro dos cidadãos aproximando-se dos orçamentos dedicados à saúde em países da OCDE e da União Europeia, excluindo ao maior denominador comum as PPP’s, privilegiando o investimento, pois só desta forma se defende a saúde.

Reestruturar significativamente este modelo de governação, que já leva mais de 25 anos, para além de ser necessário e urgente, é também prestar justa homenagem ao último trabalho de António Arnaut quando defendeu que o principal problema é o oportunismo do papel dos privados na saúde, pois, para além da Liberdade que o 25 de Abril nos trouxe, o Serviço Nacional de Saúde foi, sem dúvida ou discussão, a melhor coisa que a democracia nos deu, cabendo a todos, sem exceção, defende-lo, com unhas e dentes, pois a saúde é e vai continuar a ser o maior de todos os bens universais…

Por: Albino Bárbara

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