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A calamidade e a solidariedade

O incêndio que devastou grande parte do Pinhal Interior Norte remete todo o país para um luto que marcará a nossa memória com uma ferida indefetível. Remete, sobretudo, para os moradores das zonas afetadas, para os familiares das vítimas, mas também para todos os portugueses.

No início da fatídica semana tive a oportunidade de percorrer a linha entre Avelar e Pedrógão Grande, passando por Castanheira de Pêra e Figueiró dos Vinhos. Um périplo que terminaria no serviço de Cirurgia Plástica Reconstrutiva e de Queimados do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Percorri as estradas envoltas em cinza, as florestas ressequidas pelo fogo. Visitei os centros de intervenção e as unidades de saúde hospitalares e de cuidados primários. Estive com quem ajudou e com quem foi ajudado.

O cenário assumiu contornos apocalípticos: áreas de floresta cobertas de negro e pontuadas ainda de fumo, lembrando que a destruição tinha por ali passado há pouco tempo. Este paradoxo da natureza aproveitou a sua própria fragilidade para sugar a vida num manto escuro de devastação como se a noite se tivesse abatido nos solos em plena luz do dia.

O contexto desta desgraça foi dito, filmado, visto e repetido. Até à exaustão. No meio das tristezas, da presença da morte, da fatalidade inalterável, o que mais me impressionou foram os muitos sinais de vida e de esperança. Tal como veremos a vegetação a brotar por entre aquelas cinzas da desgraça. Somos o povo do fatum, da fatalidade, da entrega a um destino desconsolado, da falta de perspetiva de um futuro melhor. Mas no meio de tudo isto conseguimos encontrar um suspiro de esperança: a solidariedade, a mão amiga e segura que chegou dos quatro cantos do país.

Incansáveis, encontrei bombeiros, médicos, enfermeiros, técnicos, polícias, militares, populares e tantos outros dispostos a dar de si, do seu tempo, da sua ajuda para amenizar o sofrimento das gentes daquela terra. Assumo que senti orgulho ao receber centenas de mensagens de médicos voluntários dispostos a ajudar quem sofre perante esta tragédia. Inexcedíveis na solidariedade, incansáveis na ajuda!

A Ordem dos Médicos esteve nas unidades de saúde dos concelhos afetados. Face a esta catástrofe, estamos solidários com todas as pessoas que enfrentaram o terror.

Se há momentos para nos juntarmos, de profunda união em defesa dos que sofrem, este é um deles!

Por: Carlos Cortes

* Presidente do Conselho Regional do Centro da Ordem dos Médicos

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