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Corta!

Quando Trainspotting, de Danny Boyle surgiu, parecia a resposta britânica a Tarantino. Rebelde, imaginativo e mostrando de uma forma nova a realidade da juventude britânica, sem saídas e interesses, numa vida cada vez mais superficial e materialista, mas que, um pouco por todo o mundo, conseguiu encontrar quem com tal se conseguisse identificar, todos ficaram na expectativa daquilo que se seguiria. Algum tempo depois, com A Praia, seguiu-se a desilusão. Teria sido Trainspotting um caso único em que os astros de Boyle se conjugaram na perfeição para ele ter conseguido tão bons resultados? Ao ver o seu mais recente trabalho, Millions, apetece afirmar que Trainspotting foi obra de um acaso feliz. Danny Boyle, o Boyle de que todos decoraram o nome, morreu. Já não passa por aqui.

A juventude deu lugar às criancinhas. Em Millions temos duas, a boa e a má. Poderia ser de outra forma? Claro que podia. Devia. Mas não é o que acontece aqui. Dois irmãos encontram um saco cheio de dinheiro. Libras, para se ser mais exacto. Mas, problema dos problemas, faltam poucos dias para que a libra dê lugar ao euro. Que fazer a tanto dinheiro. O menino bom, que até vê santos e tudo, num conjunto de epifanias sem sentido, quer ajudar tudo o que seja pobre, mas, coitado, nem sabe muito bem o que é um pobre, ou o que quer que isso seja. Já o outro, quer lá saber dessas inutilidades e prefere comprar bicicletas, jogos e coisas tais, onde até as miúdas não são completamente esquecidas. Os adultos pouco interessam nesta história. Estão a ver o género? Isso mesmo. Filme para ser visto num qualquer canal generalista numa tarde de fim-de-semana, enquanto se vai dormitando alguns minutos.

Volta não volta, e como o público continua a fazer questão de não ir ao cinema – os números mostram o cada vez menor número de espectadores em salas de cinema – lá se inventam polémicas onde por vezes elas nem sequer existem. O sexo é sempre bom para que tais polémicas nasçam. Sempre assim foi e, quando se julga estarmos mais evoluídos nessas questões, e que já nada nos incomodar, lá vem mais um filme rotulado com escândalo ou palavras semelhantes no cartaz e em tudo o que é critica. Tal sorte coube agora a Nine Songs – Nove Canções, de Michael Winterbottom, mais um britânico que, tal como Boyle, também já teve os seus quinze minutos de fama com 24 Hour Party People, e que tal como este se espalha agora ao comprido.

Motivos da polémica que vem alimentando as discussões em redor deste filme? O sexo. Onde os outros, por hábito, cortesia, medo ou consciência de uma inabilidade para filmar tal assunto, optam por nessas alturas, fazerem elipses, Winterbottom faz o oposto. Mostra o sexo e apenas o sexo e apaga tudo o resto. Em Nine Songs o que vemos é um casal que vai a concertos e pelo meio se vai divertindo na cama, cozinha e onde quer que seja. Não se passa mais nada. Fossem esses momentos minimamente interessantes e não viria mal nenhum ao mundo, antes pelo contrário. Mas tudo é feio e desinteressante, sem nada que possa valer a pena ser visto ou ouvido.

Estivesse o filme ao nível dos seus momentos musicais (por onde passam, entre outros, Black Rebel Motorcicle Club, Primal Scream e Franz Ferdinand) e poderíamos estar perante um dos mais interessantes filmes do ano. Assim, ficamos apenas com um desastre de 69 minutos.

Por: Hugo Sousa

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