Durante muito tempo, demasiado tempo diria, a sociedade portuguesa olhou para o definhar da região do interior de Portugal com um olhar distante, despreocupado, sobranceiro e irresponsável, por considerar que o mesmo era natural e inevitável, em razão da natural perda de competitividade territorial associada ao aceleramento do processo de globalização. A própria organização territorial do país, ao nível das NUTS II, permitiu disfarçar as diferenças de desenvolvimento que aconteciam em cada região ao não permitir extrair de modo rápido e robusto indicadores estatísticos que possibilitassem uma análise comparativa séria e elucidativa acerca da dicotomia de desenvolvimento entre as regiões do interior e do litoral.
Com o passar do tempo, a ferida territorial do despovoamento – a que poucos deram atenção – causada pela queda da atividade económica e, portanto, do emprego, pelo definhar da qualidade dos serviços públicos prestados à população, pela incapacidade para atrair investimento, gerou uma hemorragia grave que não é possível estancar com políticas apenas setorais, dada a gravidade do problema.
Chegados aqui, em boa hora o governo português criou o Ministério da Coesão Territorial. É, do meu ponto de vista, fundamental a existência de uma estrutura política com poder de decisão para coordenar a implementação de políticas que visem o desenvolvimento destas regiões, quer ao nível da excelência da qualidade dos serviços públicos prestados, sobretudo na área da saúde, ação social e educação, quer ao nível da diminuição dos custos de contexto para as empresas e famílias que aqui residem, quer ao nível da capacidade de atração de investimento e criação de polos de desenvolvimento económico alicerçados na transferência de conhecimento das Universidades e Politécnicos para o setor público e privado.
Quando daqui a alguns anos estiver novamente a reler este artigo, estarei certamente orgulhoso da capacidade que Portugal teve para tornar o país mais equilibrado e livre, na medida em que um maior número de cidadãos desta região terá a liberdade de aqui poder construir o seu projeto de vida, sendo essa a sua vontade.
Por essa altura, acredito que teremos esta região em geral, mas em particular o distrito da Guarda, a recuperar de modo sustentável em cada um dos seus concelhos, em resultado do dinamismo económico existente e da capacidade de reinvenção que estes territórios terão tido.
Por essa altura a nossa região será uma referência nacional e internacional na área da Saúde, por estar dotada do que de melhor existe ao nível de infraestruturas, equipamentos e recursos humanos na rede hospitalar, destacando-se a aposta que foi feita em áreas inovadoras como a telemedicina e os cuidados paliativos. Teremos sido capazes de iniciar um amplo debate de perspetivar as respostas sociais a 15/20 anos, o que colocou toda a região na linha da frente implementação de respostas sociais inovadoras.
Por essa altura teremos um dinamismo económico surpreendente, alavancado pela visão e investimento do governo português em infraestruturas críticas para o desenvolvimento da região, como sejam o Porto Seco, o investimento na ferrovia (Linha da Beira Alta e Linha da Beira Baixa), a criação de Zonas Ecológicas de Acolhimento Empresarial, e não menos importante, a eliminação das portagens, de que já poucos se lembrarão terem existido.
Em retrospetiva concluiremos que o Instituto Politécnico da Guarda foi o braço armado do desenvolvimento da região, pois terá tido a capacidade de, em conjunto com empresas, municípios e a restante comunidade, encontrar respostas para as necessidades formativas e de investigação da região.
Por essa altura orgulhar-nos-emos do muito que evoluímos na área da inovação agrícola, das florestas, e consideraremos surpreendente a alavancagem gerada em setores como a cultura, o urbanismo, o ambiente e o turismo pelo Plano de Ação implementado no âmbito da Guarda Capital Europeia da Cultura, que se terá realizado em 2027.
Voltando ao dia de hoje, poderá parecer difícil sonhar com esse futuro, mas temos obrigação de por ele lutar e o concretizar!
Também há 21 anos o jornal O INTERIOR teve um sonho e por ele lutou, o de contribuir de um modo marcante para aproximar as nossas gentes, alertar para os problemas que assolam estes territórios, valorizar tudo o que de bom é feito (e é tanto) em cada um dos concelhos e, acima de tudo, para criar um espaço de partilha de opinião vital para o desenvolvimento de qualquer região ou comunidade.
Comemoram-se, portanto, 21 anos que O INTERIOR vem cumprindo a sua nobre missão, na certeza que continuará, como até hoje, a ser uma referência e um ator importante para este processo de reconversão que os nossos territórios, mas sobretudo as nossas gentes, anseiam e merecem!
* Presidente da Federação do PS da Guarda