A relação entre a matemática e a magia pode parecer-nos recente, mas está documentado que ela remonta desde há quinhentos anos. Sem ir mais longe, a mais antiga referência a um truque matemático surge no livro “De viribus quantitatis”, de Luca Pacioli (1445-1517). Este autor nasceu em Borgo Sansepolcro, localidade onde Piero della Francesca tinha um atelier. Pensa-se que foi aí que iniciou a sua formação. Mais tarde viajou para Veneza, onde estudou matemática com Domenico Bragadino. Depois partiu para Roma e viveu em casa de Leone Battista Alberti; foi nesta época que também estudou teologia e ingressou na Ordem Franciscana. Ensinou matemática nas universidades de Perugia, Zara, Nápoles e Roma antes de publicar em Veneza a sua “Summa arithmetica, geometria, proportioni et proportionalitá”, um compêndio da matemática que se conhecia na época e que foi uma base para o seu posterior desenvolvimento.
Os caminhos de Pacioli e de Leonardo Da Vinci cruzar-se-iam em Milão, em 1496, e entre eles nasceu uma amizade, para além de se ter forjado o início de uma colaboração. Pacioli começou a escrever o seu livro de geometria “De Divina Proportione” e para isso contou com um ilustrador de luxo, o próprio Leonardo. Posteriormente, ambos viajaram juntos para Veneza e Florença. Nesse tempo, compilaram adivinhas e passatempos matemáticos com os quais Pacioli elabora o já referido “De viribus quantitatis”. Este livro nunca chegou a ser publicado e conserva-se apenas o seu manuscrito, agora depositado na Universidade de Bolonha, onde esteve oculto durante 500 anos até David Singmaster, um matemático especialista em matemática recreativa, ter descoberto num outro livro uma referência a este texto e seguiu-lhe a pista. Pensa-se que a compilação foi feita conjuntamente por Luca e Leonardo porque muitos dos truques descritos nesse livro também se encontram nos cadernos de Da Vinci.
Entre os mágicos é voz corrente que o sucesso num número de magia corresponde a 80 por cento de psicologia e os outros 20 por centro a outro tipo de destreza, que pode ser matemática, habilidade manual, algo baseado no plano físico… o que é conhecido como “truque”. Contudo, o que realmente surpreende é que a influência do truque em todos os números seja apenas de 20 por cento e que este tenha a ver, na sua maior parte, com o saber-se o que o espetador espera, como vamos distraí-lo, como irá divertir-se depois de ser vítima da ilusão e que mecanismos funcionam nessa ilusão. Não é por acaso que existem neurocientistas que estudam os métodos utilizados pelos mágicos na ilusão. Os mágicos servem precisamente a estes cientistas como uma fonte de exemplos em que a perceção não se produz da forma esperada. A importância destas experiências será semelhante à importância dos contraexemplos em matemática. Portanto, a magia tem uma ampla relação com as ciências, não só com a matemática ou a física, como também com as ciências que neste momento se estão a desenvolver.
Os truques matemáticos são excelentes para os que se iniciam no mundo da magia porque enquanto os resolvem não têm de se preocupar com a destreza manual, pois funcionam por si mesmos, pelo menos num primeiro nível de complexidade, e permitem ao iniciante concentrar-se na apresentação do truque: como vai atrair a atenção do espetador, como vai conseguir jogar com as emoções do público, aquilo que, em suma, é o que se pretende com um espetáculo de magia.
Deixo como sugestão a visualização da “TedTalk” de Arthur Benjamin sobre matemagia…